sábado, 9 de março de 2013

Alguns “tiros saem pela culatra” e quem paga é o País. Canal de Opinião. Por: Noé Nhantumbo

  

A longa “Novela” da Linha de Sena já começou e os indianos devem estar rindo…

- Procuram-se os culpados mas estes escondem-se que nem o “diabo da cruz”…

Beira (Canalmoz) - Numa autêntica conspiração visando satisfazer interesses de determinadas corporações internacionais bem como alguns nacionais, expulsou-se um consórcio indiano alegadamente porque não conseguia entregar as obras de reabilitação da Linha de Sena.
O Banco Mundial em cumplicidade com diversas entidades locais e internacionais consentiu que créditos moçambicanos fossem utilizados para pagar despesas a empresas que não cumpriram com seus contratos.
Uma obra de grande envergadura normalmente tem uma equipa fiscalizando o seu andamento. Quando o antigo presidente do Banco Mundial visitou com pompa e circunstância as obras, acompanhado de toda a direcção dos CFM e o consórcio construtor, nada foi revelado em desabono da qualidade das obras.
Aos moçambicanos foi sempre dito que tudo estava andando “às mil maravilhas”. Afinal a fiscalização mentiu e não fez seu trabalho. Foi paga quando deveria ser penalizada.
Com a paralisação dos comboios que transportam o “esperançado ”carvão de Tete para o porto da Beira, muitos buracos e rombos revelam-se à luz do dia. Já não possível esconder que alguma coisa grave está acontecendo no domínio ferro-portuário moçambicano.
Nos portos revelam-se problemas de preçários, tarifas, segurança, especialização, lentidão, que afugentam importadores e exportadores do hinterland. Alguns aventam abandonar portos moçambicanos e passarem a utilizar Durban ou Dar es Salaam ou mesmo portos da Namíbia. O cenário, embora não seja negro, levanta preocupações justificadas.
Os gabinetes de estudo do Ministério de Transportes e Comunicações não estão conseguindo tomar conta do recado em toda a linha. Alguns analistas dizem abertamente que se trata de falta de capacidade técnica de quem está a frente deste importante pelouro. Com assuntos que se reflectem na economia geral do país não se pode dar oportunidade a gestores ingénuos e tecnicamente incompetentes. A necessidade de estudar profundamente dossiers e precaver com seriedade cenários, não está sendo tratada com a devida atenção.
Onde há muita fruta suculenta aparecem moscas e todo o tipo de pragas para se lambuzarem.
Aquilo que se previa um boom na economia nacional, a exploração e exportação de carvão, está aos poucos se revelando um fiasco, devido a incapacidade de infraestruturas para o seu escoamento. Parece que alguém “correu atrás da galinha com sal na mão”. Contratos foram com pouca transparência negociados e arranjos concluídos, em benefício de agendas em que Moçambique declaradamente pouco está ganhando.
Ser potência energética é o que Moçambique é mas “abutres” e especuladores nacionais e internacionais estão “afiando os dentes” para o banquete que se estrutura a “olhos vistos”.
Numa acção de todo planificada e estudada ao pormenor, o governo de Moçambique, através de nomeações estratégicas de quadros de sua plena confiança, entendeu que tinha acertado numa fórmula que garantiria benefícios para os intervenientes no negócio ou negociatas do carvão.
A tendência de aumento da posição estatal nos recursos minerais em evidência na América Latina está esquecida e enterrada em Moçambique. Aqui segue-se à risca a receita do Banco Mundial e de seu irmão gémeo Fundo Monetário Internacional.
É difícil acreditar que um governo que se queixa continuamente de falta de fundos, não capitalize sua posição nos consórcios que se formam para explorar recursos naturais localizados em seu país.
A Rússia tem suas reservas financeiras em alto nível porque o governo russo negoceia diligentemente seus recursos de gás natural e petróleo. Abriram as portas para o capital internacional, empresas como a BP estão lá estabelecidas mas a fatia que cabe ao estado russo é bem significativa. Em Moçambique fala-se de percentagens baixíssimas de comparticipação nos investimentos pelo governo em nome de exiguidade de recursos financeiros. Para que serve afinal o chamado endividamento estratégico? Se Angola constrói cidades servindo-se do petróleo como garantia, Moçambique não poderia, por exemplo, oferecer o gás do Pande e Temane como garantia para créditos no mercado financeiro internacional?
Montar uma fábrica de antirretrovirais em Moçambique não teria que depender da boa vontade do congresso e governo brasileiros. Nem seria necessário ceder tanto às exigências do Vale do Rio Doce no negócio da linha férrea de Sena.
Se os indianos falharam na concepção de seu trabalho de reabilitação da Linha de Sena, os CFM entanto que parceiros no empreendimento, tem a sua quota parte e nisso é preciso incluir o seu Conselho de Administração, desde os tempos do Sr. Rui Fonseca.      
Quando as coisas começam a correr mal é comum verificar-se que todos procuram proteger-se de possíveis consequências e isso assiste-se agora nos CFM.
Quando foi tomada a decisão de atribuir a um consórcio indiano a reabilitação da Linha de Sena, os CFM com recursos próprios já se encontravam a trabalhar com esse mesmo objectivo. Havia e ainda se pode dizer que existe capacidade nacional para executar trabalho de reabilitação de linhas férreas. Havendo necessidade poderiam ser contratados especialistas e consultores no mercado internacional. Na vizinha África do Sul existem empresas de consultoria que podem responder com sucesso às solicitações de assistência técnica que se considerem necessária. Afinal, os projectos de infraestruturas no quadro da SADC justificam-se e toda a cooperação regional deve ser incentivada mas isso não aconteceu com o dossier Linha de Sena. A opção, muito mais cara para o país, foi cumprir com o que o BM recomendou na altura. Restruturou-se os CFM e racionalizou-se mão-de-obra através de créditos de natureza complexa e duvidosa, concedidos pelo mesmo banco. Hoje um número considerável de trabalhadores encontra-se na situação de reformados e desvinculados tudo em nome de uma reestruturação que atirou para o desemprego milhares de moçambicanos sem ganhos visíveis.
Os peritos governamentais moçambicanos terão ido pelo caminho mais fácil e com isso toda uma experiência acumulada foi irremediavelmente perdida.
Hoje procuram-se os culpados a todo o vapor mas estes escondem-se e fogem que “nem o diabo da cruz”.
Hoje os “competentes” de ontem escondem-se e nem querem que seus nomes venham à baila, comprovada que está, toda a maquinação lesiva aos interesses nacionais que esteve na base de avaliações e celebração de acordos.
Reconhecer que há falta de know-how não é vergonhoso. Persistir e ignorar isso é que é vergonhoso e em certo sentido um atitude muito pouco adulta, digna e lógica por parte de quem se diz governo.  Os acordos foram uma burla que até agora sem esclarecimento público. O tempo rapidamente se encarregou de colocar a verdade no devido lugar.
Enganaram-se os gestores considerados nalguns círculos nacionais como os mais competentes. Rescindir com os indianos quanto custou afinal? Se somos nós que pagamos a dívida é justo que sejamos informados.    
Vejamos o caso da HCB, um consórcio internacional com sede no Canadá está a frente da operação daquela importante barragem hidroeléctrica. Isso tem um custo mas oferece garantia aos investidores e ao estado moçambicano de que não se irá colocar aquele empreendimento nas mãos de técnicos inexperientes.
A não ser retalhar e dividir entre si parte do património dos CFM, os gestores moçambicanos naquela empresa pública, não se tem dedicado com afinco e competência às tarefas que era tradicional e comum ver sendo executadas. Estações ferroviárias abandonadas e cheias de capim, bairros habitacionais da empresa degradados, complexos gimnodesportivos em ruína, locomotivas, vagões e carruagens em estado obsoleto, centros de manutenção e oficinas em estado deplorável são um cenário comum, triste e desolador. Nunca um sector que já foi o orgulho de toda uma classe de trabalhadores moçambicanos, se encontrou numa situação como esta.
Convenhamos porque não está longe da verdade que as sucessivas elites dirigentes dos CFM, se tem comportado como parasitas, sanguessugas colocando suas mordomias e conforto acima de tudo e todos. Estabeleceu-se um ambiente de “ladroagem” e saque dos recursos dos CFM de tal modo profundo e grave que os dirigentes lançaram mão a todo o tipo de esquemas para defraudar o património dos CFM.    
Uma atitude passiva, de espectadora por parte do órgão de tutela, Ministério de Transportes e Comunicações, concorreu para cimentar uma forma de estar lesiva para os interesses públicos. Uma empresa pública nacional pertence aos contribuintes e não é propriedade privada de seus gestores como parece ser denominador comum nos CFM.
Quem chega a liderança da empresa pode por e dispor de recursos que são públicos sem que haja consequências.
O descalabro que paralisou a Linha de Sena é um dos produtos da grave falta de fiscalização de obras encomendadas e pagas pelo erário público.
Ou reverte-se o quadro e tipo de gestão vigente nos CFM ou os prejuízos continuarão a ser acumulados para a economia nacional. Onde se esperava que recursos adicionais fossem postos a disposição do governo por via de receitas arrecadadas pela utilização da Linha de Sena pela VALE, Rio Tinto e outras empresas mineiras, exportando carvão pelo Porto da Beira, verifica-se que os prejuízos crescem com as intervenções que terão que ser feitas para repor a circulação dos comboios naquela linha. 
Onde se trabalha cometem-se erros que importa não ignorar.
Este momento deve servir para que os ministros dos pelouros responsáveis, a administração dos CFM reflitam com objectividade sobre que caminhos trilhar para sair-se desta vergonhosa e lesiva situação.
Há toda uma cultura de rapinagem e gatunice que deve ser abandonada e penalizada por quem de direito. Não se pode permitir que uma empresa pública seja arruinada em benefício de seus gestores de topo.
Exigem-se comissões de inquérito sérias e sindicâncias ao desempenho de quem foi encarregue de gerir recursos públicos e não está o fazendo a contento.
Há complicações e complexidade no tipo de tratamento a dar a diversos assuntos nos CFM. Muitos factos escamoteados e dossiers destruídos devem merecer a atenção do governo se houver a vontade de reverter a situação e rentabilizar a exploração ferro-portuária em Moçambique e isso acontecerá num quadro mais geral de engajamento construtivo que o governo deve desencadear.
A tarefa é gigantesca e vai requer que haja disposição e vigor em romper todo um esquema de relações de proteccionismo que foram sendo estabelecidas ao longo dos tempos. Sem que o reino da impunidade seja “degolado” nos CFM continuaremos a ter mediocridade, corrupção e nepotismo governando.
O Parlamento moçambicano não pode ficar a leste do que está acontecendo e ao abrigo de suas prerrogativas, deveria nomear uma comissão de inquérito especializada para averiguar todo o dossier CFM…
Será que o executivo moçambicano permitirá que isso aconteça?
Compete aos moçambicanos exigirem através dos instrumentos legais que seus interesses sejam acautelados e que “novelas indigestas” como a da Linha de Sena sejam retiradas do cardápio… (Noé Nhantumbo)
Imagem: www.aplop.org 

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