terça-feira, 12 de março de 2013

Deputados “obedientes” é o pior que podemos ter em democracia… Canal de Opinião. Por: Noé Nhantumbo



Beira (Canalmoz) - Não se pode deixar de questionar um órgão dispendioso que não produz resultados de maneira repetida. Há quanto tempo é Moçambique através do Orçamento Geral do Estado, está suportando todo um conjunto de deputados que não consegue realizar a sua tarefa principal, de fiscalização, das acções do executivo? Andaram carimbando relatórios como perfeitos e inquestionáveis, através de um voto ditatorial e conforme se pode ver os resultados negativos estão à vista de todos. Mediocridade generalizada na esfera governativa foi de maneira cúmplice protegida e promovida.
Agora mesmo depois de dois mandatos verifica-se que temos um governo retalhado e cobrindo suas partes íntimas com as mãos.
Quase sem acção legislativa no sentido de que não possui iniciativa na elaboração de propostas de leis, o país tem um Parlamento formal vazio ou oco, sem aquela substância que caracteriza o órgão em qualquer democracia digna desse nome. Um órgão que tem agido como que colocado ao executivo, sem questioná-lo de modo informado e profundo está transformado em meio de drenagem de fundos essenciais para a realização das agendas nacionais.  
No panorama político verifica-se uma incapacidade de promover a tolerância e um debate incondicional dos problemas e preocupações nacionais. Jogos de bastidores, de interesses, estratégias de auto-protecionismo, estão desfigurando o órgão de que se esperava ser o garante da democracia e do desenvolvimento em Moçambique.
Não se justifica ter um órgão de que se esperava trabalho resumido “carimbador” favorável das iniciativas governamentais, seguindo estritamente as instruções e sentido voto predeterminados.
Cada vez que se reúne o Parlamento, a fatia do OGE que custeia os supostos trabalhos é enorme. E para sermos honestos, a maioria dos deputados possui esse estatuto como forma encontrada de pagamento de favores políticos. Se assim não fosse o seu nível de produtividade, os seus pronunciamentos e a pertinência na sua abordagem fiscalizadora seria completamente diferente do que se verifica nos dias de hoje. Um Parlamento medíocre é fundamentalmente assim devido a qualidade de seus integrantes. Parece que há uma directiva partidária no sentido de escolherem de se escolherem medíocres para ocupar os lugares vagos ou atribuídos a cada partido. Não se pode generalizar mas a cada sessão parlamentar fica evidente qual é a fibra e substância dos deputados que temos em Moçambique. E não se pode dizer que isso terá sido ao acaso. Alguém indigitou essas pessoas a estarem onde estão hoje. A postura política centralizadora vigente na maioria dos partidos, a tendência quase clássica de se pagarem favores políticos e cumplicidades, uma estratégia de afastamento de actores políticos que se tenham revelado activos e incómodos aos verdadeiros centros do poder podem estar corroendo um órgão vital para a normalidade democrática e governativa.
Como se diz em inglês, sem “checks and balances”, não se pode falar de democracia.  
Os arranjos que governam o actual Parlamento, atendendo que um dos partidos possui uma larga maioria, atentam contra a democracia e favorecem o surgimento de tendência ditatoriais no país. Se a actual composição resulta daquilo que foram tropelias eleitorais conhecidas e comprovadas, então está montado o tabuleiro para que o jogo seja desigual, de imposição e de atropelo constante aos preceitos democráticos.
Temos uma situação de causa-efeito que arrasta todo um país e sociedade para abismo político e social. As inconsequências e desaires na esfera económica reflectem as opções políticas dos detentores do poder. Controla-se e domina o sistema judicial, a administração militar e policial e assim garante-se que não haverá veredicto desfavorável na altura de surgirem contestações relacionadas com os resultados eleitorais. Ou não tem sido assim desde os tempos de Rui Baltasar até ao presente Hermenegildo Gamito? Alguma inconsistência qualitativa por parte dos reclamantes que por vezes nem reclamar a tempo conseguem, facilita a estratégia de “obtenção de vitórias” de partido que tem governado Moçambique desde a sua independência.
Tem havido recurso sempre que oportuno, à eliminação prévia de candidatos pela sua detenção ou transferência física de seus postos de trabalho. Quando não se recorre a eliminação por via da não atribuição da documentação necessária para consubstanciar uma candidatura.
A actual composição da Assembleia da República em a Frelimo possui uma maioria que lhe permite aprovar qualquer coisa sem concurso dos opositores é um dos produtos da minúcia com que os estrategas dessa Frelimo afinaram a sua máquina global. Não era só importante vencer mas garantir uma maioria que desse aquela folga em todas acções governativas subsequentes.
Os dossiers na mão do governo, sobretudo na sua vertente económica, eram de tamanha importância que sua aprovação e execução dependiam de um parlamento complacente, obediente. 
Em situação normal e com o Parlamento agindo em consonância dos interesses nacionais seria praticamente impossível que o governo aprovasse a exploração de recursos minerais como tem acontecido. O conjunto de contrapartidas financeiras pela exploração de carvão e gás continua não sendo do conhecimento público o que claramente é uma nota negativa para o Parlamento moçambicano. Como é que os deputados não têm conhecimento sobre as contas ou dinheiros quem entram no tesouro nacional? Como cada ministro que chega ao AR para responder a perguntas, simplesmente se recusa a aprofundar assuntos e sai-se pela justificação de “segredos do negócio” e tudo fica por aí? A menção de comissão de inquérito parlamentar só existe no vocabulário pois jamais foi aplicada em Moçambique. A Comissão de Petições no parlamento existe mas suas deliberações dificilmente são cumpridas pelo governo. Há crise em comissões parlamentares como a da Juventude porque alguns de seus integrantes discordam dos procedimentos partidários de seus pares.
Claro que isto tudo é simplesmente umas leituras possíveis. Muitos dirão que a fraqueza parlamentar em Moçambique é conjuntural e está de acordo com o nível de cultura política prevalecente.
Só que este palavreado justificativo significa em última análise aceitação de um modus operandi que é lesivo aos interesses nacionais. A ladroagem institucionalizada revela a incipiência parlamentar com que os moçambicanos têm de conviver.
Os custos operacionais da Assembleia da República justificam toda uma abordagem diferente sobre este órgão. Há opções que devem ser consideradas com todo o realismo. O que não se pode continuar aceitando é o financiamento da mediocridade dos nossos deputados.
Alguma coisa precisa ser feita e com urgência neste domínio. Quando se torna claro e irrecusável que a Assembleia da República pouco difere da Assembleia Popular que já existiu em Moçambique isso merece uma atenção especial.
Se os governantes aceitam de ânimo leve que as contas continuem a ser pagas para quem não trabalha, para quem não produz legislação, para quem não fiscaliza, é porque colhem benefícios específicos da manifesta mediocridade parlamentar. Não haveria como o OGE receber aprovação sem discussão de qualidade no Parlamento.
Existe um desafio democrático que as organizações da sociedade civil moçambicanas não se podem eximir de participar. Alguma da contestação que sofrem as ong’s nacionais devem ser vistas como uma negação da sociedade ao seu silêncio cúmplice delas quando há que criticar tanto o Parlamento como o governo do dia.           
Os deputados moçambicanos têm de ser questionados todos os dias porque a sua existência, não nos sendo útil, não deve continuar a ser paga por nós. É tão simples como isso…
Aquela combinação operacional entre o governo e a maioria parlamentar serve interesses específicos. Deputados esgrimindo os seus mais altos dotes de retórica consomem tempo crucial elogiando governantes com sucessos suspeitos. É um serviço pago a peso de ouro. “Navaras e Rangers” e salários a troco do carimbo parlamentar faz tudo parte de um jogo que é pago pelos moçambicanos….

Pactuar com isso é cumplicidade com uma agenda sinistra, lesiva aos interesses genuínos dos moçambicanos. Mesmo que os ideólogos de defensores da demagogia reinante digam o contrário…  (Noé Nhantumbo)

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