Beira
(Canalmoz) - Não se pode deixar de questionar um órgão dispendioso que não
produz resultados de maneira repetida. Há quanto tempo é Moçambique através do
Orçamento Geral do Estado, está suportando todo um conjunto de deputados que
não consegue realizar a sua tarefa principal, de fiscalização, das acções do
executivo? Andaram carimbando relatórios como perfeitos e inquestionáveis,
através de um voto ditatorial e conforme se pode ver os resultados negativos
estão à vista de todos. Mediocridade generalizada na esfera governativa foi de
maneira cúmplice protegida e promovida.
Agora
mesmo depois de dois mandatos verifica-se que temos um governo retalhado e
cobrindo suas partes íntimas com as mãos.
Quase
sem acção legislativa no sentido de que não possui iniciativa na elaboração de
propostas de leis, o país tem um Parlamento formal vazio ou oco, sem aquela
substância que caracteriza o órgão em qualquer democracia digna desse nome. Um
órgão que tem agido como que colocado ao executivo, sem questioná-lo de modo
informado e profundo está transformado em meio de drenagem de fundos essenciais
para a realização das agendas nacionais.
No
panorama político verifica-se uma incapacidade de promover a tolerância e um
debate incondicional dos problemas e preocupações nacionais. Jogos de
bastidores, de interesses, estratégias de auto-protecionismo, estão
desfigurando o órgão de que se esperava ser o garante da democracia e do
desenvolvimento em Moçambique.
Não
se justifica ter um órgão de que se esperava trabalho resumido “carimbador”
favorável das iniciativas governamentais, seguindo estritamente as instruções e
sentido voto predeterminados.
Cada
vez que se reúne o Parlamento, a fatia do OGE que custeia os supostos trabalhos
é enorme. E para sermos honestos, a maioria dos deputados possui esse estatuto
como forma encontrada de pagamento de favores políticos. Se assim não fosse o
seu nível de produtividade, os seus pronunciamentos e a pertinência na sua
abordagem fiscalizadora seria completamente diferente do que se verifica nos
dias de hoje. Um Parlamento medíocre é fundamentalmente assim devido a
qualidade de seus integrantes. Parece que há uma directiva partidária no sentido
de escolherem de se escolherem medíocres para ocupar os lugares vagos ou
atribuídos a cada partido. Não se pode generalizar mas a cada sessão
parlamentar fica evidente qual é a fibra e substância dos deputados que temos
em Moçambique. E não se pode dizer que isso terá sido ao acaso. Alguém
indigitou essas pessoas a estarem onde estão hoje. A postura política
centralizadora vigente na maioria dos partidos, a tendência quase clássica de
se pagarem favores políticos e cumplicidades, uma estratégia de afastamento de
actores políticos que se tenham revelado activos e incómodos aos verdadeiros
centros do poder podem estar corroendo um órgão vital para a normalidade
democrática e governativa.
Como
se diz em inglês, sem “checks and balances”, não se pode falar de democracia.
Os
arranjos que governam o actual Parlamento, atendendo que um dos partidos possui
uma larga maioria, atentam contra a democracia e favorecem o surgimento de
tendência ditatoriais no país. Se a actual composição resulta daquilo que foram
tropelias eleitorais conhecidas e comprovadas, então está montado o tabuleiro
para que o jogo seja desigual, de imposição e de atropelo constante aos
preceitos democráticos.
Temos
uma situação de causa-efeito que arrasta todo um país e sociedade para abismo
político e social. As inconsequências e desaires na esfera económica reflectem
as opções políticas dos detentores do poder. Controla-se e domina o sistema
judicial, a administração militar e policial e assim garante-se que não haverá
veredicto desfavorável na altura de surgirem contestações relacionadas com os
resultados eleitorais. Ou não tem sido assim desde os tempos de Rui Baltasar
até ao presente Hermenegildo Gamito? Alguma inconsistência qualitativa por
parte dos reclamantes que por vezes nem reclamar a tempo conseguem, facilita a
estratégia de “obtenção de vitórias” de partido que tem governado Moçambique
desde a sua independência.
Tem
havido recurso sempre que oportuno, à eliminação prévia de candidatos pela sua
detenção ou transferência física de seus postos de trabalho. Quando não se
recorre a eliminação por via da não atribuição da documentação necessária para
consubstanciar uma candidatura.
A
actual composição da Assembleia da República em a Frelimo possui uma maioria
que lhe permite aprovar qualquer coisa sem concurso dos opositores é um dos
produtos da minúcia com que os estrategas dessa Frelimo afinaram a sua máquina
global. Não era só importante vencer mas garantir uma maioria que desse aquela
folga em todas acções governativas subsequentes.
Os
dossiers na mão do governo, sobretudo na sua vertente económica, eram de
tamanha importância que sua aprovação e execução dependiam de um parlamento
complacente, obediente.
Em
situação normal e com o Parlamento agindo em consonância dos interesses nacionais
seria praticamente impossível que o governo aprovasse a exploração de recursos
minerais como tem acontecido. O conjunto de contrapartidas financeiras pela
exploração de carvão e gás continua não sendo do conhecimento público o que
claramente é uma nota negativa para o Parlamento moçambicano. Como é que os
deputados não têm conhecimento sobre as contas ou dinheiros quem entram no
tesouro nacional? Como cada ministro que chega ao AR para responder a
perguntas, simplesmente se recusa a aprofundar assuntos e sai-se pela
justificação de “segredos do negócio” e tudo fica por aí? A menção de comissão
de inquérito parlamentar só existe no vocabulário pois jamais foi aplicada em
Moçambique. A Comissão de Petições no parlamento existe mas suas deliberações dificilmente
são cumpridas pelo governo. Há crise em comissões parlamentares como a da
Juventude porque alguns de seus integrantes discordam dos procedimentos
partidários de seus pares.
Claro
que isto tudo é simplesmente umas leituras possíveis. Muitos dirão que a
fraqueza parlamentar em Moçambique é conjuntural e está de acordo com o nível
de cultura política prevalecente.
Só
que este palavreado justificativo significa em última análise aceitação de um
modus operandi que é lesivo aos interesses nacionais. A ladroagem
institucionalizada revela a incipiência parlamentar com que os moçambicanos têm
de conviver.
Os
custos operacionais da Assembleia da República justificam toda uma abordagem
diferente sobre este órgão. Há opções que devem ser consideradas com todo o
realismo. O que não se pode continuar aceitando é o financiamento da
mediocridade dos nossos deputados.
Alguma
coisa precisa ser feita e com urgência neste domínio. Quando se torna claro e
irrecusável que a Assembleia da República pouco difere da Assembleia Popular
que já existiu em Moçambique isso merece uma atenção especial.
Se
os governantes aceitam de ânimo leve que as contas continuem a ser pagas para
quem não trabalha, para quem não produz legislação, para quem não fiscaliza, é
porque colhem benefícios específicos da manifesta mediocridade parlamentar. Não
haveria como o OGE receber aprovação sem discussão de qualidade no Parlamento.
Existe
um desafio democrático que as organizações da sociedade civil moçambicanas não
se podem eximir de participar. Alguma da contestação que sofrem as ong’s
nacionais devem ser vistas como uma negação da sociedade ao seu silêncio
cúmplice delas quando há que criticar tanto o Parlamento como o governo do
dia.
Os
deputados moçambicanos têm de ser questionados todos os dias porque a sua
existência, não nos sendo útil, não deve continuar a ser paga por nós. É tão
simples como isso…
Aquela
combinação operacional entre o governo e a maioria parlamentar serve interesses
específicos. Deputados esgrimindo os seus mais altos dotes de retórica consomem
tempo crucial elogiando governantes com sucessos suspeitos. É um serviço pago a
peso de ouro. “Navaras e Rangers” e salários a troco do carimbo parlamentar faz
tudo parte de um jogo que é pago pelos moçambicanos….
Pactuar com isso é cumplicidade com uma
agenda sinistra, lesiva aos interesses genuínos dos moçambicanos. Mesmo que os
ideólogos de defensores da demagogia reinante digam o contrário…
(Noé Nhantumbo)
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