Canal de OpiniãoPor: Noé Nhantumbo
Os “tubarões” tomaram conta do pedaço
Beira
(Canalmoz) - As frequentes notícias de dilapidação de fundos públicos, de
batotas no procurement de bens e equipamentos para o Estado e empresas públicas
são sinais inequívocos de que se estabeleceu um ambiente de promiscuidade
perigoso para a realização da agenda nacional. Os “tubarões tomaram conta do
pedaço” e agem conforme lhes apetece.
O
regime de secretismo que domina a área de assinatura de contratos para a
exploração de recursos naturais é sintoma de que uma cultura de rapina se
instalou e que a mesma é a bitola do que acontece na esfera pública. Governar,
de acto nobre, passou a ser uma plataforma de enriquecimento individual.
O
país está realmente doente. Os governantes que deveriam actuar como médicos,
diagnosticando e determinando as terapias apropriadas recusam-se a agir porque
isso iria alegadamente em contra de seus objectivos privados.
Há
como que um esgotamento ao nível das ideias. Abraçaram-se modelos de
desenvolvimento sucessivos, sem um amadurecimento de ideias e sem se dar
oportunidade crítica dos cidadãos acomodarem-se as proclamações dos
“iluminados” ideólogos do regime.
Não
houve uma recuperação ao nível dos conceitos que a liderança nacional propunha
no passado, quando os desenvolvimentos do processo político mostraram que os
caminhos sugeridos eram um fracasso ou contraproducentes.
Se
antes era evidente que se procurava moldar os cidadãos e levá-los a assumir
valores diferentes ao nível moral e ético, com o descalabro do modelo proposto
ficou um vazio que tarda a ser preenchido. Fomos como que do “Socialismo para o
Vazio”.
Fala-se
de economia de mercado, de liberalismo, de liberdade, de direitos humanos, de
Estado de Direito mas as mensagens tardam a chegar aos destinatários mais
importantes que se são os cidadãos.
“O
exemplo vale mais do que mil palavras”. Dos proponentes e executores da nova
maneira de estar em sociedade e na economia não surgem exemplos. Rouba-se
escancaradamente e aos ladrões nada acontece. Ou não é esta a situação
actual?
A
regra em vigor é “salve-se que puder”. Como é visível que os meios de
acumulação de capital e de recursos para a sobrevivência são na essência o
alinhamento político por via da filiação e militância partidária, muitos
cidadãos se veem coagidos a “vender a alma e o coração” para sobreviverem.
Toda
a herança moral e ética tradicional e ocidental que regia s relações entre as
pessoas nas diferentes comunidades foram alteradas de modo violento. Agora até
se emulam os que roubam mais, os que mais rapidamente acumulam sinais
exteriores de riqueza. Não importa como se fica rico, não tem valor algum a
origem dos fundos que se depositam nas contas bancárias. Casais aparentemente
normais vivem do crime mas a esposa não se importa qual é origem do pão que
come nem de onde provem o dinheiro que o marido usou para adquirir mais uma
nova viatura. Importa é “aparecer”. Isso tudo tem as suas consequências.
Por
exemplo do Ministério da Educação grita-se que o principal financeiro “pirou-se
com mola grossa”. Da Saúde clama-se que os roubos de medicamentos não param e
que as farmácias dos hospitais não possuem medicamentos a altura de socorrerem
os cidadãos necessitados. Nas Obras Públicas e Habitação os seus gestores
parecem mais preocupados como as “comissões” chorudas que surgem sempre que
haja grandes projectos de infraestruturas públicas. Manutenção periódica de
estradas, selar diques com rombos, melhorar defesas de aglomerados
populacionais, pensar em obras fundamentais para garantir segurança e
desenvolvimento urbano e económico está fora do leque daquilo que é em termos
práticos considerado importante e de execução urgente. “São coisas que não trazem
benefícios monetários para os envolvidos”. Como cabrito come onde está amarrado
alguns agentes da PRM optaram por fazer aluguer de armas para a prática de
crimes. Agentes da Polícia de Transito metidos na corrupção tem a tarefa
facilitada pois basta emboscar algumas viaturas para garantir uma margem de
dividendos que permite viver folgadamente.
Nas
escolas a todos os níveis o cenário é deprimente. Compram-se admissões,
compram-se certificados, compram-se testes e exames, trafica-se com tudo
incluindo o livro que deveria ser gratuito.
Estes
são alguns sintomas que mostram que o país está doente. São práticas
generalizadas e enraizadas que minam as aspirações de desenvolvimento
verbalmente difundidas pelos governantes.
Sem
exemplos claros de que o crime não compensa a tendência será decerto uma
espiral de crimes de “colarinho branco”.
Não
há processos políticos e sociais lineares. Mas sem que haja capacidade de
estabelecer mecanismos de correcção de rotas e metas, sem que a sociedade esteja
organizada de maneira a repelir tentações lesivas ao interesse geral, corre-se
o risco real de ver-se uma sociedade regredindo e inviabilizando-se.
O
que está em jogo não é a recusa do modelo proposto e em implementação.
Requer-se é uma clarificação e divulgação ampla de regras de jogo a que toda
uma sociedade se tem de submeter. Sem balizas, sem critérios claros e
compreendidos pelos sujeitos da acção social não será possível construir-se um
país equilibrado e próspero.
Com
o camp inclinado e favorecendo os que estão ancorados em posições poderosas só
se reproduzem práticas que nem ao modelo proposto correspondem.
A
selva institucional, a proliferação de instituições de fachada que na realidade
nada fazem prejudica milhões de pessoas.
Em
concreto não se pode ter um país com um Ministério Público que não investiga
nem acusa formalmente casos gritantes de dilapidação de fundos do erário
público. A justiça apregoada como igual para todos não pode estar refém das
agendas do executivo governamental nem dos partidos políticos. Não se pode
permitir que os prevaricadores e criminosos declarados e conhecidos se escondam
nas suas cores partidárias. Os conluios e as alianças que imperam no país devem
ser liminarmente combatidas com toda a força que advém do poder do estado de
direito.
Sem
infantilismos nem improvisos legalistas, sem puritanismos nem caça as bruxas é
preciso que Moçambique se torne naquele país em que a lei é igual para todos e
que suas instituições se batam todos os dias pelo seu cumprimento.
As
desculpas esfarrapadas de falta de recursos já não têm sustentabilidade nem
credibilidade. Toda a sociedade já entende que os recursos aparecem quando
determinados interesses estão em jogo. Quando se consegue arranjar dinheiro,
para renovar periodicamente a frota de veículos atribuídos aos nossos
deputados, não se pode alegar falta de recursos para não fiscalizar, as acções
de departamentos governamentais que apresentam desempenhos sofríveis.
Admite-se
que a adopção de procedimentos mais apropriados e a correcção dos mesmos leva o
seu tempo mas sem uma acção permanente de responsabilização a governação
torna-se em algo vazio, consumidor de recursos indispensáveis para acudir aos
reais problemas nacionais.
Há
que amar e gostar deste Moçambique para defendê-lo da incúria e dos abusos que
se cometem à luz do dia. Sem uma dose alta de patriotismo não há processo
político que avance.
Governar
sem incorporação de uma dimensão de patriotismo transforma as relações que se
estabelecem em “negócios de esquina” mesmo que aconteçam em hotéis de cinco
estrelas.
O
clientelismo, a via do enriquecimento rápido, fácil, sem trabalho nem suor,
está prejudicando hoje mas também minando as gerações do futuro.
É
justo que os cidadãos pretendam evoluir materialmente e ver seus familiares
crescerem em prosperidade. Ninguém está contra os ricos em si nem contra a
ambição legítima de cada pessoa. Isso que aconteça dentro de regras e do mais
completo respeito as leis do país.
Não
se pode instalar ou estabelecer um mercado informal em cada instituição
governamental de tal modo se cumpra o ditado de que “cabrito come onde está
amarrado”. Os aeroportos e fronteiras nacionais não são pasto fértil para
funcionários das forças de defesa e segurança e alfandegários enriqueçam com a
promoção de facilidades ilícitas.
A
actual onda de crimes com destaque para macabros assassinatos e violações
sexuais seguidas de assassinato das vítimas merece uma resposta contundente da
PRM. Mesmo com deficiências de formação e de meios é possível fazer-se um trabalho
melhor. Os raptos e sequestros são um novo crime para o qual a nossa PRM ainda
ano encontrou antídoto. Para além da exiguidade orçamental específica há sinais
de fragilidades tecnológicas. A polícia não pode funcionar sem meios adequados
e de alta tecnologia. Rastrear as comunicações telefónicas, localizá-las e
atacar na altura adequada depende de meios. A PRM tem a obrigação de possuir
uma equipa de helicópteros, de veículos automóveis de perseguição e
intercepção. Uma PRM funcional e credível não pode ser um depósito de pessoas
que estão a procurar de um salário para sobreviver como alternativa a
generalizada falta d emprego. Ser polícia é uma missão que se assume com
responsabilidade e orgulho. Mas “sem ovos não se fazem omeletes”…
No
exercício de construir um Moçambique mais viável, participado, e justo todos os
moçambicanos são chamados a “dar o seu litro”. Não há moçambicanos superiores
aos outros e com direitos especiais derivados de sua origem étnica, filiação
partidária, credo religioso ou outro atributo.
Combatentes pela libertação, combatentes pela
democracia, velhos e jovens, mulheres e homens todos temos responsabilidades no
que acontece. O silêncio é inadmissível nesta hora grave em que se desenham
desenvolvimentos fundamentais para Moçambique… (Noé Nhantumbo)
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