quinta-feira, 21 de março de 2013

Uganda com relativa facilidade consegue valorizar seu petróleo. Canal de Opinião. Por: Noé Nhantumbo



Moçambique tem um caso real e próximo para aprender como ganhar mais com carvão ou gás…

Beira (Canalmoz) - Quem possui recursos minerais ou de outro tipo tem no mínimo a obrigação de utilizá-los de tal forma que eles sirvam objectivos de desenvolvimento e outros que correspondam às perspectivas nacionais e sobretudo a uma agenda clara, transparente e sustentável.
Afinal é possível contrariar o jogo das multinacionais e valorizar os recursos naturais dos países como o está provando o Uganda.
Não é difícil ou complicado como tal, se os governantes de determinado país realmente quiserem. Os recursos minerais têm valor de mercado e isso deveria ser acautelado pelos governos dos diferentes países que os possuem.
Numa troca de palavras que chegaram a parar em tribunais em Londres, a empresa britânica Tullow viu-se obrigada a pagar uma taxa pela exploração de petróleo no Uganda. Depois de querer vender parte de sua participação nos poços descobertos no Uganda a ENI italiana e a uma empresa estatal chinesa sem atender as taxas devidas e considerando os lucros que auferiria, suas pretensões foram travadas pelo governo do Uganda.
Ou pagava e continuava ou simplesmente suas licenças seriam invalidadas. Uma intensa batalha diplomática com chamadas telefónicas, emails, reuniões de alto nível em Kampala e Londres não demoveu os ugandeses de suas posições.
Agora, aventa-se a hipótese de que a Tullow, através de seus executivos, equacionou financiar a campanha eleitoral de Museveni, presidente do Uganda, para facilitar o expediente de suas licenças e suas pretensões de lucrar com sua posição no negócio do petróleo ugandês.
A questão para a maioria dos países detentores de recursos apetecíveis é a sua fragilidade institucional e um ambiente permissível a jogos internos, a tráfico de influências e negociatas ilícitas proliferando ao sabor do poder político.
Toda a tentativa de apresentar empecilhos e dificuldades para o escrutínio dos cidadãos, deve-se a pretensão de uns poucos detentores do poder, em acumular com exclusividade as vantagens que os interessados pelos minerais dos países como os africanos costuma habitualmente oferecer.
Os almoços e jantaradas que habitualmente acontecem para iniciar e selar acordos e autorizações de exploração de recursos minerais são uma das ocasiões exploradas para aligeirar ou amolecer os governantes mais “renitentes”. Aqui entenda-se aqueles dirigentes que não se apresentam disponíveis a cooperarem com a “facilitação” fora das normas da razoabilidade e da protecção dos interesses nacionais.
Estamos num mundo de recursos finitos, muitas vezes escassos em que outros necessitam mas não os possuem. Então é lógico que os governos, entanto que guardiões dos interesses nacionais, se coloquem na primeira linha de defesa de  tais interesses.
Valorizar o que existe em Moçambique não deve ser uma questão fortuita que aconteça ao sabor de iniciativas individuais mas algo institucionalizado e permanentemente controlado. Queremos ver os minerais existentes sendo explorados de uma maneira fluída mas que isso traga vantagens comparativas que os cidadãos sintam e vivam. Não é demagogia ou populismo defender uma posição deste tipo e natureza.
A França, o Reino Unido, a  China, os EUA todos procedem de maneira a precaver os interesses nacionais em toda a sua movimentação na esfera económica. Quem vai a Rússia a procura de petróleo, gás ou diamantes tem de cingir-se as leis locais e pagar aquilo que o governo russo determina. Quem pretenda explorar petróleo ou gás nos EUA sujeita-se as imposições aprovadas pelas autoridades americanas. Antes de integrar a estrutura acionista de uma empresa americana, investidores chineses mesmo que possuam muito dinheiro primeiro passam pelo crivo do congresso americano numa prática estabelecida para precaver os interesses nacionais com a segurança e protecção da economia americana. Não se trata única e simplesmente de uma questão de possuir dinheiro e aplicá-lo.
Fala-se de espionagem económica e tecnológica, abordam-se conflitos como os posicionamentos estratégicos nacionais, atendem-se às necessidades económicas e financeiras decorrentes de circunstâncias específicas e tomam-se decisões de acordo com aquilo que seja considerado mais adequado a determinado país.
Se acontece desse modo nos países que se consideram adultos e desenvolvidos porque não se pode ver países emergentes tomando posições de acordo com seus interesses objectivos?
Há uma cultura governamental incapacitante e virada a satisfação de agendas que muito pouco tem a ver com os interesses nacionais. Isso debilita a economia de países com uma reserva invejável de recursos.
As chancelarias internacionais, conhecedoras em profundidade das fraquezas de países emergentes e de suas lideranças, lançam mão a expedientes até ilícitos, para acederem aos recursos naturais que lhes interessam. Dá-se um toque de normalidade e legalidade aos contratos de exploração de recursos mas na verdade, por debaixo da mesa, trocam-se envelopes chorudos e as transferências de fundos fluem em direcção a contas bancárias especialmente criadas para atender a essa “troca de favores”.
A situação da Tullow no Uganda é similar ao que acontece em Moçambique ou Angola para citar só estes exemplos. No Sudão o “forcing” das chancelarias aproveitou-se de uma situação política para acautelar seus interesses e quando viram que era consentâneo apoiar o nascimento de mais um país por secessão do Sudão não hesitaram em reconhecer e apoiar o novo país. Se hoje temos Sudão do Sul isso não surpreende e pode ser um indicativo de que as potências não hesitam em ver suas posições protegidas e seus interesses fluindo.
Moçambique estreando-se no mercado dos minerais tem e precisa de aprender rapidamente como se faz este tipo de negócio e como se protegem os interesses nacionais. Se hoje a postura dos governantes locais é isolarem-se e tratarem de todos os expedientes relativos a exploração do solo e subsolo do país é porque possuem espaço mais ou menos legal para assim procederem. Há medo de abertura e da transparência. Receia-se colocar a perder lucros ou luvas que de outro modo não seriam acumuladas. Fala-se de segredo do negócio mas na verdade é segredo das “contrapartidas individuais ilícitas”.
O estabelecimento de uma plataforma aberta e conhecida por todos, do ponto de vista legislativo, valorizando a participação de empresas moçambicanas nos grandes projectos, com margens ou percentagens estatais devidamente valorizadas e implementadas, cooperando e aprendendo com aqueles que tem experiência neste tipo de dossier, pode levar a que rapidamente se vejam ganhos com os recursos minerais que existem em Moçambique.
Possuir recursos em si não é suficiente. É preciso que eles sejam explorados e levados aos mercados. Isso faz-se através de cooperação estratégica e investimentos vultuosos.
Mas não é preciso esconder o que se está fazendo ou não se pode aceitar que um governo ou uma equipa governamental decidam por si sem dar oportunidade à uma fiscalização pertinente como se dispõem os recursos naturais do país. O carvão de Tete não pertence ao ministro dos Recursos Minerais. Obviamente que ele é o responsável do pelouro mas deve e  tem que prestar contas ao parlamento sobre tudo o que está acontecendo e quando está Moçambique recebendo por  cada tonelada que sai através do Porto da Beira. Transparência é tao simples como isso. Não queremos continuar vendo a transparência como sujeito de discursos mas algo que se sente em cada relatório que se lava ao Parlamento.
Digam-nos quanto vale no mercado internacional o gás natural. Qual foi a base de licitação das áreas de prospecção? Quanto fica nos cofres do estado por cada pé cubico de gás a exportar? Quanto ganha Moçambique pelo gás sendo diariamente escoado para a África do Sul a partir de Temane? Falemos com seriedade disto tudo sem tabus ou receios de outra ordem.
Em cima da mesa tudo o que realmente é de interesse nacional deve ser debatido em fórum próprio e à luz da legislação em vigor.
Há necessidade de aprimorar a legislação nacional sobre recursos minerais, incorporando novos posicionamentos resultantes da cooperação internacional especifica.
Não se pode continuar sendo vítima de uma suposta ignorância e deixando saírem bilhões de dólares para termos como contrapartida migalhas quase sempre direcionadas para cofres que não são públicos ou que o público não conhece e não e informado.
Sem chantagens nem sacanagem é possível disfrutar do que pertence a todos os moçambicanos. (Noé Nhantumbo)

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