Moçambique tem um caso real e próximo para aprender como
ganhar mais com carvão ou gás…
Beira
(Canalmoz) - Quem possui recursos minerais ou de outro tipo tem no mínimo a
obrigação de utilizá-los de tal forma que eles sirvam objectivos de
desenvolvimento e outros que correspondam às perspectivas nacionais e sobretudo
a uma agenda clara, transparente e sustentável.
Afinal
é possível contrariar o jogo das multinacionais e valorizar os recursos
naturais dos países como o está provando o Uganda.
Não
é difícil ou complicado como tal, se os governantes de determinado país
realmente quiserem. Os recursos minerais têm valor de mercado e isso deveria
ser acautelado pelos governos dos diferentes países que os possuem.
Numa
troca de palavras que chegaram a parar em tribunais em Londres, a empresa
britânica Tullow viu-se obrigada a pagar uma taxa pela exploração de petróleo
no Uganda. Depois de querer vender parte de sua participação nos poços
descobertos no Uganda a ENI italiana e a uma empresa estatal chinesa sem
atender as taxas devidas e considerando os lucros que auferiria, suas
pretensões foram travadas pelo governo do Uganda.
Ou
pagava e continuava ou simplesmente suas licenças seriam invalidadas. Uma
intensa batalha diplomática com chamadas telefónicas, emails, reuniões de alto
nível em Kampala e Londres não demoveu os ugandeses de suas posições.
Agora,
aventa-se a hipótese de que a Tullow, através de seus executivos, equacionou
financiar a campanha eleitoral de Museveni, presidente do Uganda, para
facilitar o expediente de suas licenças e suas pretensões de lucrar com sua
posição no negócio do petróleo ugandês.
A
questão para a maioria dos países detentores de recursos apetecíveis é a sua
fragilidade institucional e um ambiente permissível a jogos internos, a tráfico
de influências e negociatas ilícitas proliferando ao sabor do poder político.
Toda
a tentativa de apresentar empecilhos e dificuldades para o escrutínio dos
cidadãos, deve-se a pretensão de uns poucos detentores do poder, em acumular
com exclusividade as vantagens que os interessados pelos minerais dos países
como os africanos costuma habitualmente oferecer.
Os
almoços e jantaradas que habitualmente acontecem para iniciar e selar acordos e
autorizações de exploração de recursos minerais são uma das ocasiões exploradas
para aligeirar ou amolecer os governantes mais “renitentes”. Aqui entenda-se
aqueles dirigentes que não se apresentam disponíveis a cooperarem com a
“facilitação” fora das normas da razoabilidade e da protecção dos interesses
nacionais.
Estamos
num mundo de recursos finitos, muitas vezes escassos em que outros necessitam
mas não os possuem. Então é lógico que os governos, entanto que guardiões dos
interesses nacionais, se coloquem na primeira linha de defesa de tais
interesses.
Valorizar
o que existe em Moçambique não deve ser uma questão fortuita que aconteça ao
sabor de iniciativas individuais mas algo institucionalizado e permanentemente
controlado. Queremos ver os minerais existentes sendo explorados de uma maneira
fluída mas que isso traga vantagens comparativas que os cidadãos sintam e
vivam. Não é demagogia ou populismo defender uma posição deste tipo e natureza.
A
França, o Reino Unido, a China, os EUA todos procedem de maneira a
precaver os interesses nacionais em toda a sua movimentação na esfera
económica. Quem vai a Rússia a procura de petróleo, gás ou diamantes tem de
cingir-se as leis locais e pagar aquilo que o governo russo determina. Quem
pretenda explorar petróleo ou gás nos EUA sujeita-se as imposições aprovadas
pelas autoridades americanas. Antes de integrar a estrutura acionista de uma
empresa americana, investidores chineses mesmo que possuam muito dinheiro
primeiro passam pelo crivo do congresso americano numa prática estabelecida
para precaver os interesses nacionais com a segurança e protecção da economia
americana. Não se trata única e simplesmente de uma questão de possuir dinheiro
e aplicá-lo.
Fala-se
de espionagem económica e tecnológica, abordam-se conflitos como os
posicionamentos estratégicos nacionais, atendem-se às necessidades económicas e
financeiras decorrentes de circunstâncias específicas e tomam-se decisões de
acordo com aquilo que seja considerado mais adequado a determinado país.
Se
acontece desse modo nos países que se consideram adultos e desenvolvidos porque
não se pode ver países emergentes tomando posições de acordo com seus
interesses objectivos?
Há
uma cultura governamental incapacitante e virada a satisfação de agendas que
muito pouco tem a ver com os interesses nacionais. Isso debilita a economia de
países com uma reserva invejável de recursos.
As
chancelarias internacionais, conhecedoras em profundidade das fraquezas de
países emergentes e de suas lideranças, lançam mão a expedientes até ilícitos,
para acederem aos recursos naturais que lhes interessam. Dá-se um toque de
normalidade e legalidade aos contratos de exploração de recursos mas na
verdade, por debaixo da mesa, trocam-se envelopes chorudos e as transferências
de fundos fluem em direcção a contas bancárias especialmente criadas para
atender a essa “troca de favores”.
A
situação da Tullow no Uganda é similar ao que acontece em Moçambique ou Angola
para citar só estes exemplos. No Sudão o “forcing” das chancelarias
aproveitou-se de uma situação política para acautelar seus interesses e quando
viram que era consentâneo apoiar o nascimento de mais um país por secessão do
Sudão não hesitaram em reconhecer e apoiar o novo país. Se hoje temos Sudão do
Sul isso não surpreende e pode ser um indicativo de que as potências não
hesitam em ver suas posições protegidas e seus interesses fluindo.
Moçambique
estreando-se no mercado dos minerais tem e precisa de aprender rapidamente como
se faz este tipo de negócio e como se protegem os interesses nacionais. Se hoje
a postura dos governantes locais é isolarem-se e tratarem de todos os
expedientes relativos a exploração do solo e subsolo do país é porque possuem
espaço mais ou menos legal para assim procederem. Há medo de abertura e da
transparência. Receia-se colocar a perder lucros ou luvas que de outro modo não
seriam acumuladas. Fala-se de segredo do negócio mas na verdade é segredo das
“contrapartidas individuais ilícitas”.
O
estabelecimento de uma plataforma aberta e conhecida por todos, do ponto de
vista legislativo, valorizando a participação de empresas moçambicanas nos
grandes projectos, com margens ou percentagens estatais devidamente valorizadas
e implementadas, cooperando e aprendendo com aqueles que tem experiência neste
tipo de dossier, pode levar a que rapidamente se vejam ganhos com os recursos
minerais que existem em Moçambique.
Possuir
recursos em si não é suficiente. É preciso que eles sejam explorados e levados
aos mercados. Isso faz-se através de cooperação estratégica e investimentos
vultuosos.
Mas
não é preciso esconder o que se está fazendo ou não se pode aceitar que um
governo ou uma equipa governamental decidam por si sem dar oportunidade à uma
fiscalização pertinente como se dispõem os recursos naturais do país. O carvão
de Tete não pertence ao ministro dos Recursos Minerais. Obviamente que ele é o
responsável do pelouro mas deve e tem que prestar contas ao parlamento
sobre tudo o que está acontecendo e quando está Moçambique recebendo por
cada tonelada que sai através do Porto da Beira. Transparência é tao simples
como isso. Não queremos continuar vendo a transparência como sujeito de
discursos mas algo que se sente em cada relatório que se lava ao Parlamento.
Digam-nos
quanto vale no mercado internacional o gás natural. Qual foi a base de
licitação das áreas de prospecção? Quanto fica nos cofres do estado por cada pé
cubico de gás a exportar? Quanto ganha Moçambique pelo gás sendo diariamente
escoado para a África do Sul a partir de Temane? Falemos com seriedade disto
tudo sem tabus ou receios de outra ordem.
Em
cima da mesa tudo o que realmente é de interesse nacional deve ser debatido em
fórum próprio e à luz da legislação em vigor.
Há
necessidade de aprimorar a legislação nacional sobre recursos minerais,
incorporando novos posicionamentos resultantes da cooperação internacional
especifica.
Não
se pode continuar sendo vítima de uma suposta ignorância e deixando saírem
bilhões de dólares para termos como contrapartida migalhas quase sempre
direcionadas para cofres que não são públicos ou que o público não conhece e
não e informado.
Sem chantagens nem sacanagem é possível
disfrutar do que pertence a todos os moçambicanos. (Noé Nhantumbo)
Imagem: www.portalsaofrancisco.com.br
Sem comentários:
Enviar um comentário