O colectivo de operacionais dos Serviços de
Inteligência e Segurança de Estado (SINSE) endereçou, recentemente, uma carta
ao Presidente José Eduardo dos Santos, a dar conta do elevado grau de
desmotivação em que se encontram, por falta de liderança e condições de
trabalho.
Para o presente ano, o SINSE tem uma dotação
orçamental de Kz 66.6 biliões (US$ 695 milhões). Nos anos anteriores, as verbas
também foram bastante generosas. Mas o destino dado a grande parte dessas
verbas continua a ser um grande mistério para os operativos.
Na correspondência confidencial dirigida ao
Presidente, os operativos do SINSE solicitam a José Eduardo dos Santos que se
desloque aos serviços para uma reunião em que estes explanarão as suas
reivindicações e os entraves institucionais à realização do seu trabalho.
De forma antecipada, os oficiais do SINSE
revelam que o actual chefe da instituição, Sebastião Martins, poucas vezes se
apresenta ao serviço e, quando o faz, manifesta-se desmotivado e pouco orienta.
Em Outubro passado, o Presidente José Eduardo dos Santos demitiu Sebastião
Martins do cargo de ministro do Interior, que acumulava com a chefia do SINSE.
Segundo consta, enquanto ministro, Sebastião Martins recusava-se a prestar
vassalagem ao ministro de Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente da
República, o general Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”. De forma
ousada, Sebastião Martins procurava também impor limites às interferências
directas e arbitrárias de Kopelipa nas operações dos seus pelouros.
As relações entre Sebastião Martins e o chefe
dos Serviços de Inteligência e Segurança Militar (SISM), general António José
Maria “Zé Maria”, principal aliado de Kopelipa, também são péssimas. O general
Zé Maria conspirou contra o seu colega do SINSE e usurpou-lhe a competência de
espiar, infiltrar e cooptar dirigentes da oposição e sabotar iniciativas dos
partidos políticos. Esta é, actualmente, uma acção militar sob comando do
general Zé Maria.
“Conforme dizemos, quem não está com o
Kopelipa, não trabalha. É exonerado. É o que aconteceu do chefe do SINSE”,
confidenciou uma fonte. Isso explica a forma despachada com que o Presidente
aceitou a proposta do general Kopelipa para demitir Sebastião Martins do cargo
de ministro do Interior.
Agora, mais uma vez, o destino do chefe do
SINSE está à mercê do ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança do PR.
José Eduardo dos Santos, ao invés de decidir directamente sobre a carta dos
operativos dos serviços secretos, remeteu-a à consideração do general Kopelipa.
De modo geral, as intrigas palacianas têm
gravitado à volta da gestão e saque do erário público e a disputa entre
Sebastião Martins, por um lado, e a dupla Kopelipa e Zé Maria, por outro, não
foge à regra. A par da Sonangol, o sector de defesa e segurança, que consome
mais de 18 porcento do Orçamento Geral do Estado, é o principal sorvedouro da
corrupção institucional. O facto do Presidente não permitir a fiscalização
mínima das contas de defesa e segurança, facilita o saque directo, na ordem dos
biliões de dólares. Este tem sido o mecanismo privilegiado de enriquecimento
ilícito de uma selecta casta de generais.
Com frequência inusitada, sectores dos ramos
de defesa e segurança têm estado a enviar missivas ao Comandante-em-Chefe José
Eduardo dos Santos, a alertá-lo para situações graves entre as suas fileiras.
Com a mesma frequência, o Presidente da
República tem dedicado o seu silêncio estratégico às reivindicações dos
militares e agentes dos serviços de inteligência. Na prática, desde 1992, há
mais de 20 anos, o Comandante-em-Chefe não visita uma unidade militar. Fê-lo
excepcionalmente em duas ocasiões, com breves visitas ao Quartel-General do
Exército em Luanda, para render homenagem. A primeira foi a do general Simeone
Mucune, tombado no Andulo, em 1999, e a segunda foi a do general João Baptista
Cordeiro “Ngueto”, que faleceu num acidente de helicóptero, em 2002. Há 20 anos
que o Presidente também não reúne com os chefes dos ramos das Forças Armadas
Angolanas e das regiões militares.
No ano passado, membros do Destacamento
Central de Protecção e Segurança da Casa de Segurança do Presidente da
República, afectos à Unidade de Guarda Presidencial, também remeteram uma carta
ao Presidente, a reivindicar melhores condições de trabalho e dignidade no
exercício das suas funções. Lembraram o Presidente que quem o defende são os
soldados e não os generais. Essa observação encontra eco no facto do Presidente
ter, há muito, limitado a sua disponibilidade para ouvir conselhos sobre
questões de defesa e segurança. Os generais Kopelipa e Zé Maria parecem ser os
únicos a influenciá-lo.
Há uma pergunta fundamental que deve nortear
a preocupação dos angolanos. Qual é a situação real de segurança e estabilidade
do país face ao crescente nível de descontentamento no seio das Forças Armadas
Angolanas e dos serviços de segurança e inteligência?
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