segunda-feira, 4 de março de 2013

Justiça amarrada ao poder político jamais funcionará. Canal de Opinião. Por: Noé Nhantumbo



É sonho e ilusão “tolerância zero” declarada mais uma vez por altos magistrados judiciais…

Beira (Canalmoz) - Mais um ano judicial acaba de iniciar e com ele uma chuva de discursos foi proferida no país inteiro. Moçambique tem sede de justiça e os moçambicanos anseiam por ver sua situação mudando e progredindo. Há já muito tempo que se “chora” por uma justiça actuante e presente na vida dos cidadãos.
O que se passa afinal? Não é inexistência de leis nem de uma organização judicial que implantada. Se durante alguns se falava de insuficiência de magistrados, de ausência de instituições vocacionada ao ensino e formação de advogados, isso já não acontece. O país através de universidades públicas e privadas avançou na execução de programas de formação que estão produzindo resultados. Mesmo que existam problemas de qualidade dos formados e que se possa questionar a qualidade dos formadores é preciso admitir que a base para o funcionamento de um sistema de formação está estabelecido. A qualidade pretendida virá num processo em que a fiscalização institucional for consequente. 
Então o que impede que a justiça produza aquele tipo de resultados que se desejam?
Algo que se denomina promiscuidade entre o executivo e o judicial não deixa o judicial funcionar. Os políticos têm plena consciência de que uma justiça independente no sentido de real do termo, constitui um factor determinante para o funcionamento de toda a máquina governamental, do todo o enquadramento político-governamental de um país.
Nominalmente temos os poderes democráticos estabelecidos e presentes no quadro orgânico moçambicano. Mas estes poderes que deveriam viver ou conviver em interdependência subsistem dependentes de um executivo fortemente centralizador.
Sempre que existe necessidade de ver decisões tomadas e processos concretizados verificam-se recuos, silêncio e apatia das instituições de direito competentes.
A própria organização e definição de propriedades no sistema judicial são questionáveis a partir da altura que se mostra evidente que a opulência patrimonial, infraestruturas não está sendo acompanhada de melhorias de desempenho. Os investimentos estão sendo dirigidos para tudo menos para a modernização e formação específica dos agentes de justiça. A incapacidade de investigação e produção de provas consistentes é notória. Quando se acusa não e prova e legalismos circunstanciais de conveniência, estruturados sob prismas abertamente corruptos, beneficiando materialmente alguns intervenientes em processos judiciais e policiais acabam por libertar cidadãos que deveriam estar detidos aguardando julgamento.
Houve já tristemente famosos casos em que advogados de justiça conseguiram a libertação de cidadãos envolvidos em esquemas perigosos, criminais e claramente passíveis de condenação judicial. Fábricas de “mandrax” explodiram sem que as autoridades conseguissem esclarecer o caso.
Agora na era dos raptos e sequestros, a PIC emite mandatos de captura para pessoas que já estiveram sob sua alçada. Pede-se ajuda a Interpol para capturar quem esteve bem perto. Não se questiona quais são ou foram os fundamentos que levaram a que estes acusados fossem libertos e que viajassem para fora do país. Não se pergunta nada sobre os agentes que estiveram envolvidos nos processos e a razão de tantos erros processuais. Como é que funcionários públicos sénior, supostamente qualificados para dirigir sectores nevrálgicos da administração policial e da justiça cometam tantos erros processuais? E é destes processos que nascem as “solturas”. É dos erros que os advogados de defesa constroem seus fundamentos para avançarem com seus pedidos de caução, liberdade condicional e demais instrumentos para garantir a defesa de seus clientes.
Não é difícil descortinar os “buracos” artificiais especialmente criados para atender a casos específicos considerados importantes para alguns quadrantes nacionais.
Já se ouviu o PGR proclamar que o boom imobiliário é sintoma de lavagem de capitais ou que a economia moçambicana não o justifica.
Os sinais de riqueza exibidos um pouco por todo o país deveriam ser motivo de preocupação. Os assaltos ao erário público e todo o recrudescimento de casos de tráfico de drogas, de correios humanos de drogas, da emergência de novos crimes como sequestros e raptos de empresários e seus familiares demonstram a falência de todo um sistema policial e judicial. Não se pode hesitar em atribuir o nome próprio a factos visíveis. Só com realismo e sentido de responsabilidade é que se pode começar a tratar dos dossiers pertinentes.
Os discursos circunstanciais como os de cada “1 de Março”, revelam preocupação de quem dirige o sector de justiça no país. Mas a “repetição de um disco” sobejamente conhecido não está resolvendo os problemas nacionais.
São relevantes as fraquezas do sistema instalado e é de crer que seus mentores tenham desenhado tudo deste modo.
Não é por caso que se manteve um presidente do Tribunal Supremo numa situação quase que de vitalício. Não é por acaso que se observam sinais inequívocos de obediência a instruções políticas por parte dos titulares de cargos importantes no aparelho de justiça nacional.
Sente-se uma recusa forte em abraçar os preceitos conhecidos de Boa-governação ao nível do sistema judicial. 
Em mais uma ocasião como a que se apresenta neste Março de 2013 os moçambicanos clamam por sinais concretos de todos os poderes democráticos, no sentido de empenharem naquilo que trará avanços na implementação daquela agenda nacional desejada.
Falem e façam. Façam cumprir a lei, acusem e punam quem merecer esse tratamento.
Que vossas togas sejam representativas de uma agenda consentânea com as necessidades concretas dos moçambicanos ao nível da justiça.
É tempo de serem os agentes da justiça a embrenharem-se no combate activo pelo desmontar “das peças” que entravam o desenvolvimento de uma justiça que os cidadãos sintam e vivam.
Quando os magistrados judiciais solicitam que os cidadãos denunciem crimes e práticas ilícitas do seu lado também existir uma denúncia permanente das tentativas encobertas ou abertas visando manietá-los e controlarem.
Romper as “amarras” que o poder político e governamental exerce sobre o sistema é vital para qualquer pretensão visando dignificar a justiça em Moçambique. Todo o resto é pura demagogia e adiamento da verdadeira justiça… (Noé Nhantumbo)

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