quinta-feira, 14 de março de 2013

Uhuro Kenyata presidente eleito. União Africana e Tribunal Penal Internacional num braço-de-ferro?


Canal de Opinião. Por: Noé Nhantumbo


Beira (Canalmoz) - É de antever que as pretensões do TPI, julgar o envolvimento de Uhuro Kenyata em crimes cometidos no período pós-eleitoral no Quénia, se vejam rodeadas de dificuldades acrescidas. Kenyata é o presidente eleito do Quénia saído das recentes eleições presidenciais.
Uhuro Kenyata já foi parabenizado pela União Africana e vários líderes internacionais.
A credibilidade de um tribunal que superpotência, EUA, não reconhece vai decerto sair chamuscada num processo que se antevê longo e complexo.
Não vai ser fácil acusar e julgar um chefe de estado em funções. Não é o mesmo que julgar Charles Taylor da Libéria, apanhado por africanos e conveniente entregue a Haia.
Cada país e de maneira individual irão proceder a um relacionamento cauteloso com o governo de Nairobi. Mas não restam dúvidas de que interesses de segurança, cooperação na luta contra o terrorismo internacional e o papel importante de porto marítimo para alguns países africanos acabará jogando a favor do silêncio do Tribunal Penal Internacional. O país que mais directamente tem intervindo na Somália numa incursão contra um grupo islamita relacionado com a Al Qaeda tem sido o Quénia.
As relações estratégicas entre os EUA e o Quénia acabarão por ditar as regras que os outros países irão seguir. Aqui também teremos o factor “Obama”. Ele é filho de pai queniano e isso parecendo que não irá influir na tomada de posições dos diversos actores internacionais.
Quando aos vizinhos do Quénia e mesmo a União Africana é óbvio que se não entregaram o Bashir do Sudão muito menos farão para entregar Kenyata ao TPI.
Em certa medida as pretensões do TPI são pouco credíveis e profundamente estruturadas com base em posições de poder de quem dirige os processos.
Há muitos políticos que pelo mundo fora, em posições de poder a frente de governo que possuem as mãos sujas com sangue de seus concidadãos. Abundam exemplos na Europa, na América, no México, em África que deveriam já ter respondido no TPI e que jamais foram chamados. Muitos dos crimes e abusos contra os direitos humanos são factos do passado mas nem isso justifica que não sejam responsabilizados por actos que foram cometidos durante períodos em presidiam a governos em seus países.
É de prever que haja alguma escaramuça verbal entre Nairobi, África e o TPI.
Mas é difícil ver o Reino Unido ou os EUA apelando para que Kenyata se entregue ao TPI.
O realismo vai falar mais alto quando chegar a hora de tomada de decisão e vamos ver o mundo orientado por diplomatas aconselhando a que se arquive o processo contra Kenyata em prole da estabilidade de um país bastante importante para a manobra geral de muitos países.
Nessas considerações teremos jogos de bastidores de potências que são muito importantes no funcionamento do próprio TPI.
Outro facto que pode fazer desistir os acusadores é a sua incapacidade de trazer transparência ou igualdade de critérios na sua agenda de justiça internacional e luta contra praticantes de crimes contra a humanidade.
Se de facto Tony Blair e George W. Bush invadiram o Iraque e como sabemos disso resultaram muitas mortes de inocentes, sob alegações falsas, seria justo que também fossem acusados pelo TPI. Ou não é assim que procede uma entidade jurídica que se guia em factos? Mas vivemos num mundo real em as coisas acontecem de modo diferente, em que quem detém o poder político em países poderosos acaba sendo impune quando invade ou ordena invasões.
Os danos colaterais muitas vezes descritos pela imprensa internacional, ocorrendo no Afeganistão, Iraque, Paquistão, Índia superam o número de mortos pós-eleitorais no Quénia.
Cada morto é um morto que deve ser contabilizado e responsabilizado do mesmo modo no mundo inteiro e não conforme convenha as forças com interesses estratégicos numa ou noutra região do mundo.
Equidade e alteração das regras de jogo na arena internacional são algo mais urgente do que por vezes parece.
Existem oportunidades que estão sendo perdidas de se avançar com o projecto de reformulação da composição do Conselho de Segurança da ONU que são na verdade mais importantes que julgar Kenyata ou outro líder africano de momento.
Que acontecerá ao presidente sírio quando terminar o conflito?... (Noé Nhantumbo)

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