Canal de Opinião. Por: Noé Nhantumbo
Beira
(Canalmoz) - É de antever que as pretensões do TPI, julgar o envolvimento de
Uhuro Kenyata em crimes cometidos no período pós-eleitoral no Quénia, se vejam
rodeadas de dificuldades acrescidas. Kenyata é o presidente eleito do Quénia
saído das recentes eleições presidenciais.
Uhuro
Kenyata já foi parabenizado pela União Africana e vários líderes internacionais.
A
credibilidade de um tribunal que superpotência, EUA, não reconhece vai decerto
sair chamuscada num processo que se antevê longo e complexo.
Não
vai ser fácil acusar e julgar um chefe de estado em funções. Não é o mesmo que
julgar Charles Taylor da Libéria, apanhado por africanos e conveniente entregue
a Haia.
Cada
país e de maneira individual irão proceder a um relacionamento cauteloso com o
governo de Nairobi. Mas não restam dúvidas de que interesses de segurança,
cooperação na luta contra o terrorismo internacional e o papel importante de
porto marítimo para alguns países africanos acabará jogando a favor do silêncio
do Tribunal Penal Internacional. O país que mais directamente tem intervindo na
Somália numa incursão contra um grupo islamita relacionado com a Al Qaeda tem
sido o Quénia.
As
relações estratégicas entre os EUA e o Quénia acabarão por ditar as regras que
os outros países irão seguir. Aqui também teremos o factor “Obama”. Ele é filho
de pai queniano e isso parecendo que não irá influir na tomada de posições dos
diversos actores internacionais.
Quando
aos vizinhos do Quénia e mesmo a União Africana é óbvio que se não entregaram o
Bashir do Sudão muito menos farão para entregar Kenyata ao TPI.
Em
certa medida as pretensões do TPI são pouco credíveis e profundamente
estruturadas com base em posições de poder de quem dirige os processos.
Há
muitos políticos que pelo mundo fora, em posições de poder a frente de governo
que possuem as mãos sujas com sangue de seus concidadãos. Abundam exemplos na
Europa, na América, no México, em África que deveriam já ter respondido no TPI
e que jamais foram chamados. Muitos dos crimes e abusos contra os direitos
humanos são factos do passado mas nem isso justifica que não sejam
responsabilizados por actos que foram cometidos durante períodos em presidiam a
governos em seus países.
É de
prever que haja alguma escaramuça verbal entre Nairobi, África e o TPI.
Mas
é difícil ver o Reino Unido ou os EUA apelando para que Kenyata se entregue ao
TPI.
O
realismo vai falar mais alto quando chegar a hora de tomada de decisão e vamos
ver o mundo orientado por diplomatas aconselhando a que se arquive o processo
contra Kenyata em prole da estabilidade de um país bastante importante para a
manobra geral de muitos países.
Nessas
considerações teremos jogos de bastidores de potências que são muito
importantes no funcionamento do próprio TPI.
Outro
facto que pode fazer desistir os acusadores é a sua incapacidade de trazer
transparência ou igualdade de critérios na sua agenda de justiça internacional
e luta contra praticantes de crimes contra a humanidade.
Se
de facto Tony Blair e George W. Bush invadiram o Iraque e como sabemos disso
resultaram muitas mortes de inocentes, sob alegações falsas, seria justo que
também fossem acusados pelo TPI. Ou não é assim que procede uma entidade
jurídica que se guia em factos? Mas vivemos num mundo real em as coisas
acontecem de modo diferente, em que quem detém o poder político em países
poderosos acaba sendo impune quando invade ou ordena invasões.
Os
danos colaterais muitas vezes descritos pela imprensa internacional, ocorrendo
no Afeganistão, Iraque, Paquistão, Índia superam o número de mortos
pós-eleitorais no Quénia.
Cada
morto é um morto que deve ser contabilizado e responsabilizado do mesmo modo no
mundo inteiro e não conforme convenha as forças com interesses estratégicos
numa ou noutra região do mundo.
Equidade
e alteração das regras de jogo na arena internacional são algo mais urgente do
que por vezes parece.
Existem
oportunidades que estão sendo perdidas de se avançar com o projecto de
reformulação da composição do Conselho de Segurança da ONU que são na verdade
mais importantes que julgar Kenyata ou outro líder africano de momento.
Que acontecerá ao presidente sírio quando
terminar o conflito?... (Noé Nhantumbo)
Imagem: notasaocafe.wordpress.com
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