quarta-feira, 17 de junho de 2009

A Epopeia das Trevas (16)


No reino Jingola tudo o que é oficial e oficial-general é legal. Tudo o mais, incluindo a população, é ilegal.


É mediocridade, quando não se abordam questões com profundidade. Quanto mais os políticos falam, mais são estudados e menos escutados. Muitas palavras muitos devaneios. Os cérebros dos ouvintes saltam para outra plateia. Abandonam os políticos de corpo vertical e alma horizontal. A figura da África Negra é uma aventura propícia para aventureiros. Sempre concordantes com a pobreza de espírito dos governantes. E o interlúdio da pobreza e da fome prosseguem em todos os momentos, nos cartazes com fotos gigantes que iludem os eleitores votantes. Neles, as palavras democráticas: onde há pão e livros, há democracia.

Acreditar nos políticos é como viver num prédio prestes a desabar. E são tantos (os prédios). Como os generais no poder, democracia generalizada, militarizada. Com dois desejos, duas faces. Qual deles, qual delas?! Mal-educados intencionados, bons irresponsáveis, moldados e acondicionados. Como monges em falanstérios e sociedades secretas que insistem em moldar-nos, dominar as nossas mentes. Não há bons governantes, apenas homens que executam o desejo, a vontade do povo.

Um cientista Jingola disse que a população é famosa pelo seu analfabetismo. Que não tinham direito a instrução. Isso, e por causa da fome descobriu que só usavam dez por cento do cérebro.

Não sei distinguir se é a água que arrasta o lixo, ou é o contrário?! Lixo, água e comida. Na transfusão diária à Nação, o boom da cólera expandiu trinta mil infectados e morticínio de quase mil. A acção planejada das chuvas divulgará subitamente a epidemia. Na terra ávida por cadáveres, a cólera diminuirá quando a população escassear.


Abriguei-me num contentor à desespera que a chuva desalentasse. Para obter tal permissão comprei uma cerveja. Senti que a minha respiração se dificultava devido ao fumo que vulcanizava no interior. Apenas duas pequenas janelas nos extremos velavam o arejamento. Desloquei-me para a mais próxima, era, parecia o fumo do Vesúvio. Olhei para a jovem que fingia ser empregada. Tentei defender-me.
- Donde vêm tanto fumo?
- Dos geradores.
- Vamos morrer intoxicados. Presumo que há deleite nisto.
- É isso! Um é do general, o outro é dum novo-rico da padaria. Já refilei, deram-me a importância do desprezo. Reino governado por generais é assim. Subi ao castelo dos deuses sanitários, ameaçaram-me com a morte. As ameaças tornaram-se tão vulgares. Creio que devíamos mudar o nome para reino das ameaças. Esta gente são como Napoleão, é tudo deles, pensam que são invencíveis.
- Descolonizadores, novos mentores.
- Mais um campo africano da morte, mais um quilombo de caveiras.

Os olhos começaram-me a arder, a garganta a condescender. Fugi para debaixo de um toldo que servia de habitação a duas famílias que ficaram sem casa. Foi destruída por um príncipe para construir uma mansão. Podia abrigar-me da chuva se fizesse despesa. Só havia cerveja. A chuva amainou. Daqui até Tule, mais ou menos em Viana, terei que desandar cerca de vinte quilómetros.

Imagem: Angola em fotos

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