quarta-feira, 6 de novembro de 2013

A intolerância religiosa


A centenária igreja da Muxima foi invadida por um grupo de fanáticos. A imagem de Nossa Senhora foi atacada pelos membros do grupo. Alguns sectores da sociedade desvalorizaram o acontecimento.

José Ribeiro
http://jornaldeangola.sapo.ao

Mas é grave qualquer manifestação de intolerância, particularmente a religiosa. Foi invocado o facto de os autores do ataque serem jovens, para tirar gravidade ao acto. Mas os mesmos que manipulam jovens para participarem em manifestações violentas contra a figura do Chefe do Estado podem estar por trás desta acção violenta contra a democracia e que nos agride a todos, crentes e não crentes.
O bispo de Viana, D. Joaquim Ferreira, ao rezar missa na Igreja da Muxima depois da profanação, perdoou aos autores dos actos de vandalismo contra Mamã Muxima. Mas também disse que a Justiça tem que fazer o seu papel e condenar os autores de tão repugnante acto. Digo exactamente o mesmo em relação aos que ofendem o Chefe de Estado em manifestações que a coberto da liberdade são atentados à democracia.
Ontem de madrugada a igreja de Nossa Senhora de Fátima foi também atacada por fanáticos. Mais um gravíssimo atentado à liberdade religiosa. Mais uma manifestação de intolerância que merece a condenação da sociedade, crentes e não crentes. A repetição, em tão poucos dias, de actos que tocam nos sentimentos mais profundos dos angolanos, merece atenção especial e sobretudo exige uma resposta à altura. Vou apenas recordar que os ataques à Muxima e à igreja de Nossa Senhora de Fátima em Luanda, não são casos únicos. Durante a guerra, inúmeros templos de várias confissões religiosas foram arrasados por aqueles que queriam destruir a nossa pátria. O então bispo D. Alexandre do Nascimento foi raptado. Um acto que deixou todos os angolanos em choque, fossem ou não fiéis da Igreja Católica. O perdão chegou em 1992 em forma de braços abertos e compreensão. Mas os perdoados persistiram no erro até ao dia em que foi assinada a Paz. A minha dúvida é se ainda persistem. Face à realidade é lícito duvidar e não é descabido levantar o problema, num momento em que jovens, seguramente manipulados, depois de ofenderem o Chefe de Estado, profanam a igreja da Muxima e a igreja de Nossa Senhora de Fátima.
Dizer que estamos ao lado da Igreja Católica e sentimos que as ofensas de que está a ser vítima também nos ofendem, é o mínimo que se espera de todos os democratas. A intolerância religiosa é quase sempre a primeira etapa de um percurso que vai desembocar no totalitarismo. Por isso, ninguém pode ser neutro nestas circunstâncias.
O grande poeta alemão Brecht escreveu um poema onde esta problemática é colocada com grande clareza. Primeiro, diz ele, prenderam os comunistas, mas eu não me importei porque não era comunista. Depois prenderam os judeus, mas eu não me importei porque não era judeu. E os agentes nazis foram prendendo tudo e todos, até que chegou a vez do que não se importava, porque achava que não era nada com ele. A intolerância religiosa tem a ver com todos. Os ataques à democracia obrigam a uma condenação inequívoca dos democratas. As profanações de igrejas merecem a condenação de todos. Foi porque muitos angolanos acharam que não era nada com eles, que meia dúzia de jovens ofenderam o Chefe de Estado em manifestações cujo fim era o puro arbítrio e provocar a repressão por parte das forças policiais, para nos palcos internacionais serem desencadeados ataques a Angola e aos que foram eleitos pela maioria dos eleitores.
Quiseram fazer em Angola uma primavera ao estilo árabe, mas não pegou. Provocaram as forças da ordem pública para se fazerem de vítimas. Não pegou. Agora entraram pelos caminhos perigosos da intolerância religiosa. Muito menos vai pegar, porque isso não faz parte do modo de ser dos jovens angolanos. Em Angola, a liberdade de expressão é praticada por quem quer, mas não pode ser aproveitada para começarmos a destruir o edifício da democracia e do progresso económico e social que tanto custou a construir, com o sangue e o suor de muitos angolanos.
A repetição do crime mostra que alguém anda a instigar à prática desses actos. Mas espero que depois de tantos fracassos, os autores morais e materiais se decidam a abraçar a ideia da democracia e entrem no campo do jogo democrático pacífico, dizendo o que querem, comunicando olhos nos olhos. O diálogo franco e aberto é melhor do que a violência cega. Manipular jovens para profanarem igrejas é um crime. Cabe à Polícia investigar e aos tribunais julgar.

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