‘Os
nossos irmãos acabam de informar-me que o seu local de oração no Huambo foi
também encerrado, esta manhã, à semelhança do que ocorreu noutras províncias
nos meses anteriores”, disse inicialmente David Alberto Já, referindo adiante
que a mesma foi fechada sob ordens expressas das autoridades policiais da
província do Huambo, que alegam terem recebido orientações de Luanda.
Com o encerramento desta mesquita, o número
de templos eleva-se já para 60, segundo a fonte, sendo que as únicas que ainda
mantém as portas abertas são as de Benguela e Luanda, que, segundo o
responsável da comunidade muçulmana em Angola, correm também o mesmo risco, já
que a maior parte delas foram fechadas sem o conhecimento prévio dos seus
responsáveis. “A qualquer altura elas podem ser também fechadas”, afirmou.
Deplorou que “infelizmente tem sido esta a
prática recorrente das autoridades competentes, elas não notificam os
responsáveis das mesquitas, enviam a Polícia, esta chega ao local e ordena o
encerramento, e não diz mais nada”, queixou-se David Alberto Já, o rosto
visível da Comunidade Islâmica de Angola (COIA), para quem a situação tem
estado a criar desconfortos no seio dos fiéis.
Segundo o líder espiritual islâmico, as
autoridades angolanas já mandaram fechar mesquitas nas Lundas Norte e Sul,
Moxico, Bié, Cuando Cubango, Huíla, Cunene, Namibe, e Zaire, reiterando que
tais encerramentos, que considerou de compulsivos, apanharam de surpresa os imã
(pastores) destas comunidades. “Nenhum deles foi notificado nas suas respectivas
áreas de jurisdição”, disse.
Em conversa com O PAÍS, o responsável
descreveu o encerramento das mesquitas como sendo ilegal, na medida em que são
fechadas sem qualquer explicação plausível aos seus possessores, inviabilizando
a adoração dos seus fiéis em várias regiões do país, como determina o Alcorão,
o livro sagrado do Islão, que é composto por cinco pilares (mandamentos) mais
importantes.
“Nunca fomos notificados”
Mostrando-se agastado durante as declarações
feitas na viatura de reportagem de OPAÍS, já que foi encontrado fora do seu
gabinete de trabalho, David Já disse não compreender as razões que estão na
origem da proibição do culto aos seguidores do profeta Maomé. “Eu sou o
responsável da comunidade, tenho um vice-presidente que é Oeste-africano, nunca
fomos notificados, tanto pelo Ministério da Cultura, assim como o da Justiça,
que julgo serem os órgãos competentes”, desabafou. Considerou o encerramento
das mesquitas como sendo uma violação à Constituição da República de Angola
(CRA), que consagra num dos seus artigos que o culto é facultativo e deve ser
feito num local apropriado e fechado, sem perturbar a ordem. “É o que temos
feito. Nós não entoamos hinos que perturbem a vizinhança, não fazemos barulho,
não tocamos instrumentos, ou coisa parecida, onde está afinal o nosso mal?”,
questionou David Já.
Disse que a instituição que dirige tem uma
cooperação saudável com as autoridades angolanas, e tem dado o seu contributo
em várias vertentes para o engrandecimento deste imenso país, tanto muçulmanos
angolanos, como estrangeiros, estes últimos que aportaram em Angola em busca de
melhores oportunidades de vida.
“Temos muçulmanos nacionais e estrangeiros,
estes últimos maioritariamente de países africanos, outros asiáticos, exercendo
várias actividades legais, sobretudo na área de comércio e hotelaria,
construção civil e outros, cuja acção tem contribuído para o engrandecimento da
economia”, disse, afirmando desconhecer se no seio da comunidade existam “
personas non gratas”.
“Se no meio destes fiéis, há pessoas que
vivem ilegais, atropelando a lei dos Serviço de Migração e Estrangeiro (SME),
violam a Constituição da República de Angola, praticando actos indecorosos ou
outros que coloquem em risco a segurança e estabilidade do país, o Estado está
aí para autuar, e pode contar com a nossa colaboração, como sempre estivemos de
mãos abertas”, disse David Já.
O Islão não é seita
Disse ainda que a instituição que dirige em
Angola, cujas estatísticas recentes apontam para um universo de mais de 800 mil
fiéis, sendo 23% angolanos que aderiram ao Islão por convicção e outros ainda
por laços matrimoniais, não faz parte das seitas que foram proibidas de exercer
actividade religiosa no país pelo Ministério da Justiça, conforme lista
publicada recentemente no Jornal de Angola.
“Não somos uma seita como aquelas que foram
ilegalizadas, sem qualquer desprimor por elas. Nós somos uma religião
monoteísta como a cristã e a judaica que acreditam na unicidade de um só Deus
e, repito, não somos uma seita à procura de uma afirmação, mas uma religião que
existe desde a humanidade”, declarou, reforçando que a “Comunidade Islâmica
está indignada com o encerramento dos seus locais de culto”.
Explicou que as principais religiões
tradicionais (cristã, judaica e islâmica) estão “condenadas” a coabitarem
juntas, cada uma respeitando a outra, sem, entretanto, intrometer-se, mas
convivendo numa sã harmonia. “Isto foi sempre assim, desde os tempos mais
antigos e não vejo a razão de encerrar as mesquitas que coabitam pacificamente
com outras religiões, como é a cristã em Angola”, frisou.
E ainda, “a religião que dirijo, não tendo
sido notificada por quem de direito para encerrar as suas portas e com
justificações plausíveis, julgo que está no direito de exercer as suas
actividades ”.
Decisão Política
David Já enquadrou o encerramento de
mesquitas como sendo uma decisão política oculta e não jurídica, acrescentando
que a tendência de quem está a mandar encerrar as mesquitas é a de silenciar o
Islão no país e proibir os seus fiéis de fazerem as adorações como sempre o
fizeram em qualquer parte do Mundo, inclusive em países maioritariamente
cristãos.
“O nosso país tem uma Constituição que
garante a liberdade de culto e de religião, havendo isto no nosso ordenamento
jurídico, não vejo motivos pelos quais está-se a encerrar ilegalmente as
mesquitas”. Apelou, de seguida, a quem de direito para dar uma explicação sobre
a tendência de se encerrar esta religião secular que, segundo afirma, tem mais
de dois bilhões de fiéis no Mundo.
Suporte do Islão
O Islão como religião é constituído por cinco
principais pilares: profissão da fé, cinco orações ao dia, (que devem ser
feitas às cinco, treze, quinze e trinta, dezoito e dez e às dezanove horas de
todos os dias ininterruptos. Em caso de falha de alguma, deve ser recuperada.
Jejum, esmolas aos mais necessitados e a peregrinação, são outros pilares que
enformam ainda a crença islâmica.
O imamu referiu que a peregrinação à Meca, em
obediência ao quinto e último pilar consagrado no Alcorão, em consonância com o
calendário islâmico, é um dos momentos mais altos da exaltação da fé de um
crente muçulmano.
“É um dia muito importante para os muçulmanos
que se deslocam a este lugar santo”, destacou.
A romaria à Meca, onde os fiéis vestidos
geralmente de túnicas brancas consideram que terá sido lá onde o profeta Maomé
fez o seu último discurso há mais de catorze séculos, deve ser feita pelo menos
uma vez na vida de um muçulmano, desde que haja possibilidades para se deslocar
ao também conhecido Monte Piedade. Os que não têm este privilégio, segundo
David Já devem contentar-se com a feitura de orações e a imolação de um animal,
cabrito, preferencialmente.
Imolação de um animal
É uma tradição secular, lembrando o momento
em que Abraão esteve disposto a sacrificar o seu próprio filho Isaac, em
cumprimento de uma ordem divina. Depois de imolado o animal, a carne é
distribuída aos vizinhos, amigos e também aos demais necessitados para todos
festejarem este dia que tem um significado ímpar para os muçulmanos, que no
cristianismo tem a dimensão de Natal, festa do nascimento de Jesus Cristo.
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