segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Luanda. Narrativa de pesadelos... (Artigo de Gustavo Costa censurado no Novo Jornal)




Palavra na Hor@gá Gustavo Costa
NOVO JORNAL

Desde o princípio, sempre se deu conta da presença de santos rumores. Eram difundidos em ondas hertzianas de muito má qualidade. Que escondiam códigos excêntricos, embrulhados em panfletos financeiros que, distribuídos a torto e a direito, mal sabiam que concorriam para a deterioração da nossa paisagem social. Desta vez, não se está diante de simples rumores. Que, sendo inocentes até prova em contrário, poderão não ser tão santos quanto parece. Como não o foram quando, na logística castrense, explodiu o primeiro escândalo da “mercearia sem merceeiro”. Rudimentar e sem orações de dividir. Desta vez, não haverá escoriações tão profundas aos órgãos internos do MPLA, para este voltar a sentir-se obrigado, em defesa da sua honra moral, a imunizar-se, temporariamente, com uma fita isoladora para sarar as feridas... Desta vez, não haverá rumores configurando um enxame de kinguilas a glorificar um vago-mestre. Não, desta vez, não haverá nada disso. Desta vez, dir-nos-ão que a leitura foi posta em dia e encomendado, com alta distinção, um “upgrade” em finanças público-privadas num dos novos Politécnicos do Palanca City... Desta vez, sempre perseguidos pelos malditos rumores, não voltaremos a ver ressuscitado, fez agora um ano, um novo pesadelo como o arresto de um avião da TAAG algures em Portugal. Desta vez, ninguém se lembrará que, entre “o deve e o haver”, há sempre alguém disposto a lambuzar-se para se divertir com as contas de subtrair. E de conspurcar o nosso pequeno mundo com um fedorento cocktail que, misturando Christian Dior com bagre fumado, tenta mostrar à juventude, de que tanto se fala, que se pode tomar por cinzento, uma combinação mal acabada de preto e branco. Desta vez, perante esta genialidade aromática, há que resistir também à patética tentação de estarmos sempre a ser alvos de uma conspiração internacional, como se o mundo não tivesse mais nada para fazer, senão preocupar-se com os nossos desvarios. Não sei, aliás, a esse despropósito, por que razão, aos olhos do mundo, desta vez, nos voltamos a sentir assim tão importantes para sermos perseguidos por toda a gente. Agora, até pelos brasileiros que, por sinal, até mantém as mais cordatas relações de amizade e de cooperação com Angola. Por isso, confesso que, desta vez, tenho cada vez mais dificuldades em compreender essa congénita obsessão...
Não sendo essa pretensa “perseguição mundial” movida por causa da “maldição do petróleo”, não acredito também que, desta vez, possa ser por causa do nosso invejável índice de desenvolvimento educacional cuja arrepiante pobreza, não nos permite sequer ter uma instituição do ensino superior entre as 100 universidades africanas. Então porque será? Típico dos endinheirados de taberna, que apenas acreditam no poder que julgam possuir, quando, à sua passagem, sentem os vizinhos e os seus caciques dobrarem a coluna, desta vez, só pode ser por julgarmos que Luanda é o centro do mundo e o Palanca, a capital... Desta vez, não se está diante de simples rumores. Desta vez, em presença de um caso que envolve cidadãos angolanos, há que aguardar que as autoridades policiais do nosso país sejam notificadas. Não vale a pena, por isso, entrar em paranóia e ver inimigos onde eles não existem. É preciso saber deixar a política para os políticos. E à justiça, o que é da justiça, sendo certo, desde logo que, nesta matéria, quem se emporcalha publicamente com actos ignóbeis, tem de assumir os encargos das suas traumáticas imoralidades. Quem o faz, não pode depois escudar-se na famigerada mania da perseguição, nem espernear sob o pretexto de que se pretende atingir “outras figuras do Estado”. Porque estas, quando assediadas, são atingidas directamente, sem recurso a intermediários cujo peso na geopolítica vale zero!
Quem se molha em fanfarrices imorais, não pode, pois, esperar que a sociedade, que não pode aparar determinado tipo de golpadas, os acolhe e os proteja. Gozando do princípio da presunção de inocência, quem é posto em causa nas venenosas paródias agora esventradas pela Polícia Federal do Brasil, que abraçam crimes por e esclarecer nas instâncias judiciais, até prova em contrário, não pode, no entanto, ser visto como um criminoso. Não se deve, portanto, condenar em praça pública quem não tenha sido julgado pelos tribunais. Nem fazer uma associação maliciosa deste caso, aos laços familiares que um dos visados mantém com determinadas “figuras do Estado” sobre actos que, vindo a ser tomados como crimes pela justiça brasileira, são da única e exclusiva responsabilidade pessoal, de quem os pratica. Mas, estando, desta vez, o país perante um verdadeiro “case study”, os visados, para se livrarem das acusações estampadas na imprensa do Brasil, nada melhor fariam senão enfrentar e desafiar, serenamente, a justiça daquele país. Como o fez o nosso Procurador-Geral da República, que aguardou pacientemente pelo desfecho de um processo movido pela justiça portuguesa, que acaba agora de ser arquivado por reconhecida ausência de fundamentos legais para o julgarem. Neste escândalo ango-luso-brasileiro, revelando-se eventualmente destituídas de provas as acusações que recaem sobre os angolanos nele envolvidos, estes nada melhor fariam também senão intentar uma acção judicial contra os órgãos de comunicação social brasileiros que as veicularam por crime de difamação e calúnia. Desta vez, a pátria ficar-lhes-ia muito grata... É avisado, porém, não deixar de reconhecer que a Polícia Federal do Brasil, que figura entre as mais bem preparadas do ponto de vista da perícia criminalística e da investigação criminal, depois de um ano de investigações, não se terá baseado, propriamente, em boatos ou suposições. E é, desde logo, difícil imaginar que alguém possa entregar um dossier à Interpol, se não tiver substância.... Ninguém, nem mesmo Angola, pode ficar indiferente a um pedido da Interpol. Vamos, por isso, desta vez, aguardar, sem fantasmas, pela sua notificação, ainda que nos custe aceitar que nos autos daquela polícia, dificilmente alguém sai ileso.... É preciso, por outro lado, não deixar de olhar para a costela partidária de quem é atribuído um dos papéis de maior relevância nesta escabrosa “novela” e, para os efeitos dos seus estilhaços sobre os telhados do MPLA. Porque, o que a importação dessas nojentas cenas podem, desta vez, oferece de bandeja ao MPLA como presente envenenado, não são mais do que explosivas narrativas dos pesadelos que pairam sobre o poder em Angola e que ameaçam embaraçá-lo cada vez mais. É, pois, preciso mostrar à sociedade, que a tendência para a gratificação e que o recurso ao corta-mato no caminho do sucesso, tem custos e paga-se caro. Ora, não se podendo, em muitos casos, defender o indefensável, em política, muitas vezes, impõe-se o sacrifício de determinadas cabeças em nome da regeneração do próprio sistema. E, não é, seguramente, por ser detentor de uma maioria absoluta, que o MPLA deve continuar a almofadar no seu seio gente desprovida de princípios, que se, não borra a escrita à entrada, invariavelmente, entorna o caldo à saída... Um partido com a dimensão histórica do MPLA, notabilizada pela militância nas suas fileiras de personalidades de insigne estatura moral, ética e cultural como Mário Pinto de Andrade, António Jacinto, Agostinho Neto, Ilídio Machado, Viriato da Cruz, Paulo Jorge, Lúcio Lara e outros distintos nacionalistas, tem que se dar ao respeito para... ser respeitado. Por uma questão de honra política. Por uma questão de decência ética. Por uma questão de higiene intelectual. E de asseio social. Mas, estando agora em causa a imagem de Angola - e não apenas de um partido - se já nem isso conseguimos preservar, então o melhor, desta vez, é fecharmos a loja para obras e tirarmos todos umas “graciosas”...

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