sábado, 16 de novembro de 2013

Pão à custa de sangue e lágrimas de gente - Marcolino Moco


Luanda - Tal como previ no texto anterior, o último discurso sobre Estado da Nação do Presidente José Eduardo dos Santos, teria o mérito (para ele) de, como disse textualmente, fazer com que

Fonte: marcolinomoco.com

“nos próximos dias ninguém em Angola, ou em qualquer parte do mundo, vai mais falar de detenções perfeitamente ilegais e em condições inimagináveis, no século XXI, num país democrático, sem direito a visitas de familiares e de advogados, de miúdos como o “Nito Alves”, com apenas 17 anos; e todos se esquecerão de que nesse mesmo país democrático, com 11 anos da paz, de que se diz ser “arquitecto”, quem se manifesta no quadro da lei e de forma pacífica, se tem direito é a umas boas cacetadas, e ai do jornalista que tentar noticiar estas verdades. E por Portugal e Angola, muitos portugueses será vê-los a tremer de medo em relação a uma coisa que nem pode acontecer, e nem foi afinal assim dita pelo Presidente de Angola, por não poder romper relações económicas com um Estado onde a própria filha foi permitida (não se sabe como, perante as normas e as práticas que eu conheço de Portugal e da União Europeia!) a assenhorear-se de uma série de activos e empreendimentos”.

Ausente do país por uma curta temporada, não posso observar directamente o que por lá se passa. Mas falam-me de manifestações, por todo o país, de apoio às declarações “clarividentes de Sª Exª, o camarada Presidente José Eduardo dos Santos”, como é habitual, em movimentos induzidos à custa de meios públicos, num país onde desaparecem pessoas, e outras, com um pouco mais de sorte, são submetidas a vexatório tratamento que chega à tortura pública, se, com meios próprios, procurarem exercer o seu direito à manifestação contra tanta arbitrariedade.

Em Portugal, observo justamente o que previ. Empresários, diplomatas e até intelectuais, pedem “de joelhos” (e alguns até de forma injustificadamente arrogante!) que os jornais portugueses não toquem nos probleminhas dos dignitários angolanos, como por exemplo, os crónicos e mundialmente falados problemas do general Bento Kangamba. Que se fale disso em França, no Brasil, nos Estados Unidos ou noutra parte qualquer do mundo. Mas aqui em Portugal não, “por favor, não, não, não!”; e acrescentam essa expressão que faz escola em Angola, curiosamente com mais intensidade desde que temos paz : “não estraguem o nosso pão”.

É o que se deveria esperar das “compras” descomunais e estratégicas que vinham sendo, e continuam a ser feitas, pela família presidencial de Angola e seus mais próximos (a quem chamam de “empresários angolanos”, “os angolanos” ou mesmo “Angola”) em Portugal: tornar um país de democracia avançada na Europa, numa coutada de vassalos de um “reinado absolutista africano”.

Mas eu, qual velho cágado africano, calcinado por tantos sóis e molhado por tantas chuvas, não acredito que pão obtido à custa de tanto sangue e lágrimas de gente, nos venha sustentar por muito tempo, angolanos e portugueses, ou outros cidadãos deste mundo.

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