terça-feira, 21 de julho de 2009

A Epopeia das Trevas (26)


- É!.. São bons crentes, confiam na divindade que rege o Universo. Naquele que é a origem do cadinho, que nos criou, nos originou. Sois os Politburo que aceitam um só deus mas que seguis as doutrinas do feitiço. Tudo é decidido e explicado pelo feitiço. Concedo-vos prazo de trinta anos para acabarem a contenda. Depois exijo que façais eleições senão…
- Senão o quê?
- Altercarei a dívida com juros muito pesados. O vosso corpo será mais pesado que o chumbo, e não o podereis suportar.
- E perdidos nos encontraremos desarrumados. Malditos gregos que inventaram a democracia e mais as eleições.

Os Jingola acessavam uma emissão de rádio, onde amiúde proclamavam, desabafavam vicissitudes incomensuráveis. Apesar dos esforçados Politburo para a silenciar, ela resistia bravamente. Era o rumo dos sem rumo, assim divinizavam a Rádio Oráculo. Alguns casuístas comparavam-na a Asterix o Minigaulês, que resistia arrumado, aprumado num cantinho sombreado da mafumeira. Os Politburo rabulavam que a Rádio Oráculo era o seu calcanhar de Asterix. Os circuitos telefónicos mais íntimos da governação paladinavam que era o calcanhar da função do real.

Jingola propagandeava a epidemia de cólera, que militava com muitos aderentes para o interior do reino. Como praga ratada sem navios mercantes. Frechei-me com grande constrangimento: ninguém ousou explicar que a principal causa da cólera… é a fome. A epidemia cadastrou ao infinito de Jingola. A Rádio Oráculo solicitou anuência para implementar o seu feixe hertziano a todos os ouvidos do reino, para que as populações se informassem, acautelassem, sanassem a epidemia. Os Politburo liminarmente recusaram. Cartaram, selaram, pergaminharam para a Rádio Oráculo.

Reverendíssimas Excelências da Rádio Oráculo:
Havemos um contrato com o barqueiro Caronte. A epidemia da cólera faz as vítimas suficientes, as almas que o barqueiro necessita a contento. Sentimo-nos felizardos.
Se o sinal da vossa fé se digladiasse pela rádio e por todo o reino se espalhasse, não cairiam vítimas da cólera. Contamo-nos peremptórios firmados, e esse vosso pretenso vento é… não aceite.
Alvejamos a certa teologia do querem ir mais longe, para além das redondezas, dos limites de Delfos. As distâncias curtas por vezes tornam-se longas.
Permitimos que funcionem devido à frequência democrática que nos foi imposta. Encetámo-la no compêndio das contrariedades.
Estendemos-lhes um dedo, agora querem a mão, depois o corpo.

Para convencer que somos democratas, anunciámos que se realizariam eleições. Notem bem: que se realizariam… em qualquer momento, em qualquer época. Tudo depende da nossa íntima vontade. Não é a claridade de qualquer oráculo que nos leva ao cume solar, datar eleições. Uma coisa é incerta: o principio da incerteza eleitoral.
Os nossos insignes marinheiros vigiam atentamente as proas do vosso ecletismo. Pretendem entreabrir a janela da noite escura, para a missa de manhã. Fazer muita luz, para jorrar nos espíritos. Com tanta vela por aí à disposição. Estamos à vela.
Abundantes Saudações Revolucionárias.
Jingola, Frimário, Ano II.
Ano da Vida Incerta.

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