sexta-feira, 31 de julho de 2009

A Epopeia das Trevas (32)


- Igreja sem milagres não faz sentido. Os crentes vivem, precisam disso. Andam sobre brasas, perderam o tino. Como comboios desgovernados, perdidos sem estações, apeadeiros, sem paradeiros. Como avalancha seca de pedras a rolar por montanha, que acolhemos, prometemos o paraíso. Entes em tais condições acreditam em qualquer coisa.
- Operários contratados para a fábrica do Senhor. Fabricantes de dízimos.
- Está a brincar ou quê?! Olhe que não se brinca com as Sagradas Escrituras, e muito menos com o santo nome de Jesus! Isto é-nos muito sagrado!
- Colonialismo, neocolonialismo, não há diferença. Difere nas mudas do capital volátil.
- O que é que disse?!
- Que os mitómanos se igualam.
- É isso! Não há crença sem melómanos. Um órgão soberbo bem afinado põe os crentes em êxtase. Não me pergunte que não sei porquê, ninguém sabe... como o amor.
- Ninguém sabe…
- Verdadeiramente ninguém o sabe explicar. Batemos na boa porta desse desconhecido com a religião, os crentes vão na conversa e facturamos em nome do amor.
- Tirando proveito do instinto de conservação das espécies.
- Sim! Sim! O amor de fábrica com os crentes convencidos que são operários… que trabalham para o amor. Não somos diferentes dos outros. Ganhar dinheiro com a crendice humana começou na Terra com os primeiros humanos. Somos apenas maiorais espertos. Despertámos para explorar o passado e o próximo futuro. A meu ver não há nenhuma revolução que acabe connosco. Quando revolucionam, no início somos expulsos, espoliados, martirizados, empalados. Enfim, culpados de tudo. Depois a sanha esmorece. Encarnamos com vigor, mais poderosos. Sumamente negociamos muito bem com a religião. Sem dúvida, é o negócio mais apetecível. Custos inexistentes, os crentes suportam-nos. É o melhor negócio e patrocinado por Deus. Num piscar de olhos somos clientes VIP dum banco. É a dolce vita.
- E o ausente Voltaire quando reencarna, os alicerces bíblicos desmoronam-se?
- Facílimo! Chiamos aos crentes que os falsos profetas chegaram. Eles arrebatam-nos.
- E se não resulta… Contra-Reforma?
- Formulamos: Ab hoc et ab hac, que significa: por aqui e por ali : a torto e a direito. Vamos no seguro, seguramos as torneiras das fontes limpas governais… para que Dat veniam corvis, vexat censura columbas, que traduzido diz: A censura poupa os corvos e persegue as pombas.
- Os templos das memórias aquiescem mudos, soçobraremos sem mudança?
- Aparentemente mudam, mas na verdade não. Inventam-se constantemente novas tecnologias que dizem ser apropriadas para o humano. Curiosamente quanto mais sofisticadas são, a miséria, a fome acompanham-nas. Fico com a certeza que nunca vi tanta escravidão, tantas mortes silenciosas como hoje em dia. Se não houver mudanças, os esqueletos futuros serão arquivados nas enciclopédias de outras civilizações. Serão encontrados, estudados, como uma espécie desconhecida que passou pela Terra. Os investigadores dos tempos futuros trabalharão muito para descobrir, explicar, o enigma deste fenómeno humano.
- Que as seitas cozinharam no pão do espírito
- Claro! É o apanágio das seitas religiosas. De noite todos os gatos são pardos. Um lobo visionário cunha um culto qualquer, alforja-se e vira empresário. O aproveitar da religião é sucesso para toda a vida, sabe porquê?
- Faz render o peixe!
- Livre de impostos.
- Daria boa sacerdotisa, mas não me agrada.
- Na Veni, Vidi, Vici, há lugar para si, aceita?
- Não!

Imagem: http://alemmarpeixevoador.blogspot.com/

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