"Num pais com todos os ingredientes dum Estado falido", diz Sánchez Rico.
EL PAÍS
POR FRANCESC RELEA 28/06/2009
Grande parte do território nacional, que inclui 82 ilhas do arquipélago Bijagós e numerosas pistas de aterragem da época colonial, está fora de controlo. A Marinha tem apenas duas embarcações em funcionamento. A Força Aérea só existe nominalmente, porque nem sequer tem um helicóptero. "Na Guiné-Bissau só voam os mosquitos", comenta o general Juan Esteban Verástegui, chefe da missão da UE para a reforma do sector da segurança.
Às sete da manhã, o clube militar de oficiais de Bissau, habilitado provisoriamente como sede do Estado-maior General, é um viveiro de soldados fortemente armados. São o escudo do homem mais protegido do país. "Este posto é de alto risco", admite o chefe máximo, José Zamora, vestido de uniforme de tarefa e boina, ao recordar a bomba que matou o seu antecessor na sede do quartel-general do Exército. Os três últimos chefes militares da Guiné-Bissau morreram violentamente. Zamora esforça-se em transmitir uma sensação de normalidade, ainda que a mensagem que sai das suas entranhas não é tranquilizadora, num país onde os militares têm a última palavra. "Aqui faria falta um ditador, no bom sentido, para moralizar a sociedade", diz sem pestanejar. "Para combater o narcotráfico é preciso alguém que esteja limpo. Disseram-me os americanos quando lhes pedi meios para enfrentar os traficantes".
Na mesma entrevista acusa directamente o ex ministro e candidato presidencial Baciro Dabó de estar por detrás do atentado que custou a vida ao anterior chefe das Forças Armadas. "Mas este político tem imunidade e não o podemos citar a declarar", disse. Dias depois, o ex ministro e comandante do Exército morreu enigmaticamente por homens uniformizados na sua casa. Idêntica sorte correu o ex ministro da Defesa Hélder Proença. Os militares deram uma versão difícil de acreditar que acusava as vítimas de prepararem um golpe de Estado, pese tratar-se de dois políticos controvertidos, vinculados com o anterior presidente Vieira. Quer dizer, para impedir um golpe mataram à queima-roupa a dois dirigentes políticos.
É paradoxal. Poucas lições de limpeza moral pode dar o Exército deste país, pese as palavras do seu chefe. Basta escutar Lucinda Barbosa, directora geral da Polícia Judicial (PJ), único corpo de segurança com competências para combater o narcotráfico. Tem 60 agentes – espera contar com 107 nos finais do ano –, mal remunerados e sem recursos, frente a um inimigo com dinheiro de sobra para comprar vontades. "É difícil lutar contra o crime organizado, exige muita inversão e tempo", afirma. "Fica muito por fazer, mas algo temos feito", acrescenta.
As três maiores capturas de droga, entre 2006 e 2008, foram episódios dignos da melhor película de intriga. O primeiro carregamento (674 quilogramas de cocaína), interceptado no porto de Bissau, está valorado em 20 milhões de euros. A droga desapareceu dos depósitos do Tesouro Público e a investigação segue aberta. No operativo do segundo carregamento (634 quilos), descarregado numa antiga pista de aterragem da época colonial a 50 quilómetros de Bissau, caem detidos o capitão Rui Na Flack e o tenente Augusto Armando Balanta. São liberados por ordem do então chefe das Forças Armadas, Tagmé Na Wae, que se erige em juiz. Quatro meses depois, os colombianos Juan Pablo Camacho e Luis Fernando Ortega são detidos com 95.000 euros, duas granadas, um fuzil AK-47, uma pistola e gás paralisante. Saem livres depois de pagarem uma fiança.
O caso mais escandaloso estala em Julho de 2008, quando aterra no aeroporto internacional da capital guineense um jacto privado procedente da Venezuela. Aparentemente tem problemas técnicos. Em poucas horas chega outra nave desde Dakar com a presumível missão de prestar assistência técnica. O cúmulo de irregularidades é incrível. Nenhum dos dois aviões tem plano de voo; desde o primeiro momento, o Exército apodera-se da situação e estabelece uma linha vermelha ao redor da primeira nave; as autoridades aeroportuárias e a Polícia Judicial não podem acercar-se do lugar; o Governo só é informado ao cabo de seis dias.
"Os militares dizem que o avião transporta medicamentos para as Forças Armadas e nós dizemos que não", recorda Lucinda Barbosa no seu despacho da direcção geral da PJ enquanto mostra várias fotografias. Nelas vêem-se soldados de uniforme descarregando caixas do avião debaixo da supervisão do comandante Papa Camará, chefe da Força Aérea. A directora da PJ está convencida de que aquelas caixas contem 515 quilos de cocaína que desapareceram como se se tratasse de fumo.
EL PAÍS
POR FRANCESC RELEA 28/06/2009
Grande parte do território nacional, que inclui 82 ilhas do arquipélago Bijagós e numerosas pistas de aterragem da época colonial, está fora de controlo. A Marinha tem apenas duas embarcações em funcionamento. A Força Aérea só existe nominalmente, porque nem sequer tem um helicóptero. "Na Guiné-Bissau só voam os mosquitos", comenta o general Juan Esteban Verástegui, chefe da missão da UE para a reforma do sector da segurança.
Às sete da manhã, o clube militar de oficiais de Bissau, habilitado provisoriamente como sede do Estado-maior General, é um viveiro de soldados fortemente armados. São o escudo do homem mais protegido do país. "Este posto é de alto risco", admite o chefe máximo, José Zamora, vestido de uniforme de tarefa e boina, ao recordar a bomba que matou o seu antecessor na sede do quartel-general do Exército. Os três últimos chefes militares da Guiné-Bissau morreram violentamente. Zamora esforça-se em transmitir uma sensação de normalidade, ainda que a mensagem que sai das suas entranhas não é tranquilizadora, num país onde os militares têm a última palavra. "Aqui faria falta um ditador, no bom sentido, para moralizar a sociedade", diz sem pestanejar. "Para combater o narcotráfico é preciso alguém que esteja limpo. Disseram-me os americanos quando lhes pedi meios para enfrentar os traficantes".
Na mesma entrevista acusa directamente o ex ministro e candidato presidencial Baciro Dabó de estar por detrás do atentado que custou a vida ao anterior chefe das Forças Armadas. "Mas este político tem imunidade e não o podemos citar a declarar", disse. Dias depois, o ex ministro e comandante do Exército morreu enigmaticamente por homens uniformizados na sua casa. Idêntica sorte correu o ex ministro da Defesa Hélder Proença. Os militares deram uma versão difícil de acreditar que acusava as vítimas de prepararem um golpe de Estado, pese tratar-se de dois políticos controvertidos, vinculados com o anterior presidente Vieira. Quer dizer, para impedir um golpe mataram à queima-roupa a dois dirigentes políticos.
É paradoxal. Poucas lições de limpeza moral pode dar o Exército deste país, pese as palavras do seu chefe. Basta escutar Lucinda Barbosa, directora geral da Polícia Judicial (PJ), único corpo de segurança com competências para combater o narcotráfico. Tem 60 agentes – espera contar com 107 nos finais do ano –, mal remunerados e sem recursos, frente a um inimigo com dinheiro de sobra para comprar vontades. "É difícil lutar contra o crime organizado, exige muita inversão e tempo", afirma. "Fica muito por fazer, mas algo temos feito", acrescenta.
As três maiores capturas de droga, entre 2006 e 2008, foram episódios dignos da melhor película de intriga. O primeiro carregamento (674 quilogramas de cocaína), interceptado no porto de Bissau, está valorado em 20 milhões de euros. A droga desapareceu dos depósitos do Tesouro Público e a investigação segue aberta. No operativo do segundo carregamento (634 quilos), descarregado numa antiga pista de aterragem da época colonial a 50 quilómetros de Bissau, caem detidos o capitão Rui Na Flack e o tenente Augusto Armando Balanta. São liberados por ordem do então chefe das Forças Armadas, Tagmé Na Wae, que se erige em juiz. Quatro meses depois, os colombianos Juan Pablo Camacho e Luis Fernando Ortega são detidos com 95.000 euros, duas granadas, um fuzil AK-47, uma pistola e gás paralisante. Saem livres depois de pagarem uma fiança.
O caso mais escandaloso estala em Julho de 2008, quando aterra no aeroporto internacional da capital guineense um jacto privado procedente da Venezuela. Aparentemente tem problemas técnicos. Em poucas horas chega outra nave desde Dakar com a presumível missão de prestar assistência técnica. O cúmulo de irregularidades é incrível. Nenhum dos dois aviões tem plano de voo; desde o primeiro momento, o Exército apodera-se da situação e estabelece uma linha vermelha ao redor da primeira nave; as autoridades aeroportuárias e a Polícia Judicial não podem acercar-se do lugar; o Governo só é informado ao cabo de seis dias.
"Os militares dizem que o avião transporta medicamentos para as Forças Armadas e nós dizemos que não", recorda Lucinda Barbosa no seu despacho da direcção geral da PJ enquanto mostra várias fotografias. Nelas vêem-se soldados de uniforme descarregando caixas do avião debaixo da supervisão do comandante Papa Camará, chefe da Força Aérea. A directora da PJ está convencida de que aquelas caixas contem 515 quilos de cocaína que desapareceram como se se tratasse de fumo.
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