sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

2015… E agora? Alves da Rocha





Os primeiros dias de Janeiro continuaram a assinalar a tendência regressiva do preço do barril de petróleo e, consequentemente, de agravamento de uma crise económica em Angola, para a mitigação da qual o Governo tem de dar provas de vontade política.
Mas as dificuldades para 2015 e anos subsequentes tocam outras áreas. Com o declínio acentuado das reservas internacionais do País, a desvalorização do kwanza é uma medida de política monetária inevitável. Que efeitos?

http://expansao.co.ao/Artigo/Geral/52719

? As divisas (dólar, euro, rand sul-africano, libra esterlina) vão tornar-se muito mais caras, limitando o volume de transferências para o exterior, a todos os títulos (salários dos expatriados, lucros, dividendos e juros do capital, ajudas familiares, viagens).
? As importações tornar-se-ão ainda mais caras, já que sofrem actualmente do efeito-preço da nova pauta aduaneira.
? A inflação vai aumentar, e o poder de compra médio dos rendimentos, diminuir. A contenção da subida dos preços através da política monetária tem limites reais dados pela necessidade de se injectar massa monetária na economia para a fazer crescer. A produção nacional não tem ainda índices de eficiência económica e produtiva que lhe permita trabalhar com redução de custos e de preços dos produtos finais. Aliás, a redução/eliminação dos subsídios aos preços dos derivados de petróleo pode ser um factor adicional de aumento dos custos de produção internos.
? O crescimento do PIB pode atenuar-se (sabe-se que o Governo está a trabalhar numa revisão do cenário macroeconómico constante do OGE e que configurava uma taxa de variação de 9,7%, manifestamente irreal, como em artigos anteriores tive oportunidade de comentar, estimando-a agora na vizinhança de 7,5% para um preço do barril do petróleo em 60 USD) e o desemprego aumentar ou, no mínimo, o emprego não aumentar na proporção desejável pelas autoridades e população.
E se, porventura, o preço do barril descer até 40 USD, como algumas agências internacionais antecipam?
Entre Janeiro e Dezembro, as receitas do petróleo foram de 28 mil milhões USD, menos 3,12 mil milhões de USD face a período equivalente de 2011. Aliás, uma tendência de decréscimo que se tem repetido. Segundo dados oficiais, em 2013 as receitas fiscais totais foram da ordem dos 45 mil milhões USD e, para 2015, são esperados 41,8 mil milhões USD, para um preço médio do barril do petróleo de 81 USD (OGE 2015).
Para um preço médio de 60 USD o barril, as receitas fiscais baixarão para 32,8 mil milhões de USD, ou seja, uma quebra total de 15,7 mil milhões USD face a 2013. Estes cálculos baseiam-se numa produção média diária de 1,8 milhões de barris (taxa de crescimento de 10,7% para este sector face a 2014). No entanto, existem nuvens bem carregadas quanto ao comportamento da procura mundial de petróleo.
Segundo as perspectivas da BP, a taxa média anual de variação da procura de petróleo até 2035 provavelmente será de apenas 0,8%, devido a uma série de razões, de onde avultam o abrandamento significativo do crescimento da China, a finalização do essencial dos processos de industrialização das mais importantes economias emergentes, os processos de aumento da eficiência e da eficácia no consumo de petróleo nas economias mais desenvolvidas e tecnologicamente mais avançadas, o desenvolvimento de outras formas de energia primária e alternativa e a poupança no uso doméstico e nos transportes.
De acordo com a Bloomberg, as dificuldades em se exportar petróleo da África Ocidental (em particular Angola e Nigéria) mostram que o excesso de oferta está a aumentar, em vez de diminuir, o que é consistente não apenas com os dados da BP anteriormente referenciados, como também com as análises e projecções da Agência Internacional de Energia. Ou seja, em vez de 1,8 milhões de barris diários, Angola poderá apenas produzir/vender 1,7 milhões de barris diários. Ou seja, as receitas fiscais totais poderão ser de 30,9 mil milhões USD. Mas este efeito-quantidade poderá ser ainda mais relevante se, como referi na crónica anterior, as petrolíferas resolverem diminuir a produção por desincentivo dos preços.
Evidentemente que a um preço de 40 USD o barril, os efeitos serão dramáticos. O que está na origem desta crise petrolífera deflacionária? Em 1973 e 1978 ocorreu uma crise de sinal contrário, com aumentos substanciais do preço médio do barril que provocaram situações complicadas sobre a taxa de crescimento económico das economias desenvolvidas e levaram ao estudo e investigação de modelos de consumo mais poupadores e de novas fontes energéticas para o crescimento económico. Numa perspectiva de longa duração - 1973/2013 -, encontram-se diferentes fases de comportamento do preço do barril de petróleo (para além das duas anteriores):
? Entre 1985 e 1999 situou-se abaixo de 20 USD. O ano de 1998 foi seguramente o pior para Angola com o preço médio do brent a situar-se em 12,7 USD. Com a guerra civil num dos seus pontos mais altos, o Estado nem dinheiro tinha para pagar salários.
? Entre 2000 e 2008, o preço médio apresentou um comportamento sempre ascendente no intervalo 25 USD-100 USD. Foi uma das fases de maior estabilidade e amplamente favorável aos produtores desta matéria-prima energética.
? Em 2009, foi o crash súbito, com a crise económica e financeira mundial e o preço a baixar para 60 USD. ? Entre 2010 e 2013 ocorreu a recuperação e o preço médio do brent foi de 99,1 USD por barril.
? Durante 2014, ocorreram baixas sistemáticas daquele valor que vão facilitar a recuperação económica de muitos países desenvolvidos, em especial da Europa, e prejudicar o crescimentodos países produtores de petróleo.
Os cálculos actuais apontam para um recuo médio de 50% nos últimos seis meses do ano, o que é verdadeiramente dramático para Angola.
Para os especialistas nesta matéria, ainda são os restos dos efeitos nefastos da crise mundial de 2008/2009 a explicar a actual situação no mercado mundial de crude, aos quais se juntam os factores que já enumerei mais atrás. Mas existe por detrás de toda esta situação uma 'guerra política' comandada pela Arábia Saudita contra os Estados Unidos, o Irão, o Brasil e a Rússia.
A sua justificação para, em nome da OPEP, se não reduzirem os actuais níveis de produção é o receio de esta organização e os seus membros perderem a sua quota de mercado. A extracção de petróleo de xisto nos Estados Unidos só é rentável se o preço do petróleo não descer de 50 USD o barril e o pré-sal precisa de um preço de mais de 100 o barril USD.
O custo de extracção de petróleo on shore na Arábia Saudita é de cera de 5 USD o barril, podendo, portanto, suportar quebras ainda maiores no preço médio internacional. Mas não é só esta vantagem de custo baixo.
Durante os anos dourados, este país árabe do Oriente Médio acumulou fantásticas reservas financeiras (cerca de 800 mil milhões USD) propiciadas por um colossal diferencial entre preço de venda e custo de produção. Será que se está perante o regresso do petróleo barato? Neste cenário, o nosso país arrisca-se a entrar em recessão.
E a diversificação? Não há nenhum dirigente político do MPLA e do seu Governo que agora não fale da diversificação da economia. Isto não acontecia há quatro ou cinco anos, em que o essencial do discurso oficial era a reconstrução das infra-estruturas e a acumulação primitiva de capital. E agora, como financiá-la num clima de recessão nas receitas do Estado e da economia e de eventual retracção do investimento directo estrangeiro?
Agora é que é a oportunidade de se pensar seriamente na diversificação, 'inventar' poupanças e fontes de financiamento novas (algumas devem passar pelas sugestões da minha anterior crónica), corrigir/eliminar vícios de trabalho baseados no oportunismo e no paternalismo, apadrinhar o empreendedorismo e a criação de know-how nacional (o know-how existente pertence aos expatriados, que não o repartem e o usam para renovar contratos de assistência técnica ou de consultoria dos quais os angolanos pouco têm beneficiado), e valorizar o salário e o trabalho dos angolanos.



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