por Maka Angola
Em 2006, o Gabinete para a Cidadania e Sociedade
Civil do MPLA publicou uma brochura sobre valores morais e atitudes a adoptar
pelos mais novos, intitulada “Criança Educada, Família Feliz”.
A simplicidade e pertinência das mensagens, no
sentido de incutir bom comportamento às crianças, e preveni-las sobre os
perigos das brincadeiras com o fogo e com a electricidade, tiveram impacto
junto dos petizes que a leram.
O MPLA procurava educar, por essa via, as crianças
a distinguir o bom do mau comportamento e o bem do mal.
Na última página, a brochura apresenta uma foto de
José Eduardo dos Santos e apelas às crianças que o respeitem sempre como o
presidente de todos os angolanos e o símbolo da unidade nacional.
Essa simbologia vai ao ponto do governo do MPLA ter
atribuído, em 2001, o diminuitivo de José Eduardo dos Santos, Zé Dú, ao Parque
e Biblioteca Infantil situada no Bairro Azul, em Luanda. Simbologia porque a
referida instituição é a única biblioteca pública infantil em toda a cidade de
Luanda e, quiçá, no país. Durante muitos anos, inscrevia-se, num mural do
parque, um dos pensamentos lapidares do grande líder, o presidente Dos Santos:
“O futuro pertence às crianças”.
Além disso, Luanda tem apenas duas bibliotecas
públicas, a nacional e a do governo provincial de Luanda, que são muito pobres
e exíguas para uma cidade de seis milhões de habitantes.
A abertura da biblioteca, ao público, foi apenas
simbólica e breve. Na verdade, também faltavam os livros para as crianças lerem
e aprenderem algo ou, simplesmente, divertirem-se. Desde então, a biblioteca
mantém-se encerrada e sem um único livro.
A manutenção do parque, no início, levou inclusive
ao cerco do mesmo com arame farpado, para impedir muitas crianças dos musseques
adjacentes e outras personas non gratas de violar a ordem daquele espaço
público.
Curiosamente, as autoridades de direito tiveram
apenas a preocupação de remover a placa comemorativa da inauguração do parque,
pelo então governador Aníbal Rocha, em representação do patrono do parque e
Presidente da República, José Eduardo dos Santos.
Para além de ser uma lixeira, enclausurada numa das
áreas residenciais mais nobres e caras de Luanda, o Parque e Biblioteca
Infantil Zé Dú tem outra serventia no período nocturno. Prostituição, drogas e
álcool dominam as transacções no local. Vez por outra, agentes da Polícia
Nacional impõem a sua lei e a sua ordem, sovando os guardas do parque, e
extorquindo-lhes parte dos proventos obtidos por facilitarem o uso do parque
para tais iniciativas.
O culto de personalidade à volta do chefe e sua
dedicação às crianças e jovens encontra eco e ilustração na criação da
Universidade José Eduardo dos Santos. A referida instituição foi criada em
2009, para servir as províncias do Huambo, Bié e Moxico, sem quaisquer
condições básicas para o efeito. Os homens do chefe instalaram a Faculdade de
Economia numa escola primária, na cidade do Huambo, tendo penalizado as
crianças. A situação mantém-se até hoje.
Em 2008, o Ministério da Reinserção Social
adjudicou à empresa portuguesa Somague a construção de um Centro de Acolhimento
de Crianças, na zona do Cambiote, nos arredores da cidade do Huambo, orçado em
US $31 milhões. As obras deveriam ter sido concluídas em 2010. O Centro
Regional de Acolhimento, Educação e Inserção Social de Crianças e Adolescentes,
acolheria 150 alunos internos, 450 externos, bem como 600 estudantes de cursos
técnico-profissionais, segundo declarações públicas do ministro da Reinserção
Social, João Baptista Kussumua, na altura.
Mas, no ano passado, os homens do presidente
usurparam a infraestrutura que albergaria o primeiro centro moderno e
devidamente apetrechado para crianças desamparadas, por iniciativa do governo.
Converteram-na em Campus Universitário José Eduardo dos Santos. As crianças
desamparadas ficaram sem o centro e não se vislumbram quaisquer alternativas
para as acomodar ou educar.
Como o camarada presidente disse: “O futuro
pertence às crianças”. Para que assim seja, as crianças precisam mais de livros
para aprenderem do que do culto de personalidade para adorarem o Zé Dú. Ou será
o contrário?
Sem comentários:
Enviar um comentário