por Maka Angola
Aos 15 anos, Nito Alves teve uma ideia simples e
generosa: a de partilhar informação crítica sobre o quotidiano do país, com os
seus vizinhos e transeuntes.
Desde o início da primavera árabe, em 2011, Nito
Alves tem realizado o seu projecto através de um mural móvel que exibe frente à
porta da sua residência, em Viana, Luanda.
Semanalmente, o jovem seleciona algumas páginas dos
semanários, com matérias críticas, e cola-as num grande placar de madeira, o
seu mural. A sua ideia gerou dezenas de leitores diários, entre vizinhos e
transeuntes, que se detêm à sua porta para se informarem.
Por essa iniciativa e pela sua participação em
manifestações anti-regime, Nito Alves tornou-se uma figura de referência no
Bairro do Chimuco, no município de Viana, onde reside.
Em Dezembro passado, agentes da Direcção Nacional
de Investigação Criminal (DNIC) e da Polícia Nacional, cercaram a residência
dos seus pais por volta das 3h00 da madrugada para o prenderem. “A polícia
revistou até debaixo da minha cama, onde eu estava a descansar com a minha
esposa. Nessa altura, o meu filho já tinha abandonado a nossa casa, por causa
das perseguições da polícia e de militantes do MPLA”, disse o pai Fernando
Baptista. Aos 16 anos, Nito Alves tornou-se um foragido político.
O seu pai é um homem de semblante carregado. É
circunspecto. Fernando Baptista é um veterano da Polícia Nacional. Oriundo de
Malanje, serviu no Kuando-Kubango durante as famosas batalhas de Mavinga e do
Kuito-Kuanavale. Não fala de más recordações da guerra, mas apenas de uma bela
memória. “Foi ali onde eu conheci a minha querida mulher, a mãe do Nito Alves”.
Agora, o filho deste casal, entrelaçado pela
guerra, é visado pelos círculos de propaganda oficial como o rapaz que incita o
povo à violência, à guerra. É elementar, para a realização de uma guerra
(convencional, de guerrilha ou combinada), a existência de duas ou mais forças
armadas antagónicas. Em Angola, as forças armadas de defesa e segurança
encontram-se sob controlo absoluto do governo do presidente José Eduardo dos
Santos. Qualquer indício de guerra em Angola não seria senão uma cisão dentro
do próprio regime. A eventualidade de uma cisão violenta nas fileiras do regime
também não produziria uma nova guerra no país, porque se resumiria a ajustes de
contas internos. Um levantamento popular generalizado tem a potencialidade de
fazer implodir, com efeito imediato, a indescritível arrogância dos senhores do
poder e donos de todas as coisas dos angolanos. Com a generosidade do povo,
haveria alguma irritação contra a falta de humildade e a roubalheira dos
dirigentes. Ouvir-se-iam clamores de justiça, mas tudo se encaminharia para o
diálogo inclusivo e a transição para a era pós-Dos Santos.
Será esse o verdadeiro temor que apoquenta o
presidente e desorienta a sua máquina de propaganda? Só os servos do senhor o
saberão.
Nito Alves foi detido a 12 de Setembro, em
condições rocambolescas. A sua prisão, segundo testemunhos recolhidos em Viana,
teria sido inicialmente planeada pelas forças policias como um
“desaparecimento”. Os agentes da Polícia Nacional agarraram-no na rua. Nito
Alves gritou o seu nome e pediu, a quem o ouvisse, para alertar a Rádio
Despertar a dar conta do caso. Um transeunte fê-lo de seguida.
A principal acusação, formulada pelos
investigadores da Polícia Nacional contra Nito Alves, foi a deste ter incorrido
no acto de difamação do presidente José Eduardo dos Santos.
Na realidade, o trabalho combinado da Polícia Nacional, da Direcção Nacional de Investigação Criminal e da Procuradoria-Geral da República acabaram por causar mais danos à imagem do presidente do que o Nito Alves.
Na realidade, o trabalho combinado da Polícia Nacional, da Direcção Nacional de Investigação Criminal e da Procuradoria-Geral da República acabaram por causar mais danos à imagem do presidente do que o Nito Alves.
Primeiro, a detenção do jovem ocorreu horas antes
do início do Fórum Nacional da Juventude, uma encenação que juntou mais de
3,000 participantes para ouvirem um discurso do presidente dirigido à
juventude.
Segundo, a conferência de imprensa da Polícia
Nacional, na sexta-feira, prova, de forma clara, que o regime do presidente
José Eduardo dos Santos é uma ditadura. Numa democracia não se prendem pessoas
que pretendem manifestar-se pacificamente contra o governo ou jovens que usam
camisolas a chamar ditador ao presidente. Isso é um sinal de que o regime não
tem qualquer tolerância para com a liberdade de expressão dos seus cidadãos.
Ditador, ladrão, corrupto, são insultos comuns aos governantes em democracia.
Para além do seu tom de brutalidade, o comunicado
da Polícia Nacional é ridículo e reminiscente… Quantos pessoas teriam sabido da
existência das 20 camisolas ofensivas à imagem de Dos Santos?
Além disso, durante o seu interrogatório e na cela
da esquadra do Capalanca, onde passou a primeira noite, antes de ser
transferido para as celas da Direcção Provincial de Investigação Criminal
(DPIC), Nito Alves revelou os seus dons de mobilização. Politizou os outros
detidos sobre o regime e os seus actos e juntos fizeram coro contra as
injustiças, para irritação dos seus guardas.
Agora, o Nito Alves, aos 17 anos, é uma figura de
referência contra o regime corrupto do presidente José Eduardo dos Santos. Essa
é uma proeza da Polícia Nacional que o encarcerou. É aqui que o servilismo, a
incompetência e a propaganda começam a ter um efeito contraproducente e
irreversível. Estão a dar corpo e crédito ao movimento popular de contestação
ao regime.
Fernando
Baptista e Adália Chivongue, pais de Nito Alves, em sua casa.
Companheiros
de luta de Nito Alves junto ao mural que se tornou famoso, no bairro Chimuco,
em Viana.
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