A deputada
da UNITA Miahela Weba faz um “balanço negativo” dos cinco anos da Constituição
angolana. Para sustentar a afirmação, Miahela, em declarações ao SOL, diz que,
formalmente a Constituição é uma coisa - mas na prática “não há pontos
positivos” porque não se materializam.
“É uma lei que
foi feita para ser violada todos os dias. Não tem eficácia jurídica porque
ninguém a respeita”, acusa Miahela, citando como exemplo a não permissão do
direito de manifestação e de reunião, além da falta de liberdade de imprensa.
“Há aspectos da Constituição com os quais poderia eventualmente rever-me,
nomeadamente os direitos fundamentais. Todavia, como não são cumpridos, é como
se não existissem”, considera a deputada da UNITA.
A responsável
lembra que a Constituição garante ainda direitos iguais aos partidos políticos,
contudo o maioritário - MPLA - é “claramente beneficiado”.
Afirma também
que “gostaria que fosse revista a forma de eleição do Presidente”, assim como
“a possibilidade de o PR ser efectivamente fiscalizado”.
“Tem todos
os poderes e não pode ser fiscalizado, por não ser responsável pelos
respectivos actos de governação”, lembra, e conclui: “Se o PR não é responsável
pelos actos de governação que possam configurar crime, então ele pode fazer
tudo”.
Ter apenas o
português como língua oficial é, para Miahela, “um desprezo pela cultura
angolana e as suas tradições”.
“As sete
principais línguas nacionais deveriam ser consideradas línguas oficiais de
Angola”, defende, além de sugerir que “o direito sobre a terra deveria ser
originário do povo e não do Estado”.
O
secretário da FNLA para os Assuntos Parlamentares, Ndonda Nzinga, manifesta
também a oposição do partido ao método de eleição do PR. E, ao SOL, classifica
como “excessivos” os poderes atribuídos ao cargo.
O
responsável defende que pelo menos estes dois aspectos têm de ser revistos no
articulado da actual Constituição. Além disso, Ndonda Nzinga exige também a
consagração constitucional do direito de voto aos cidadãos angolanos residentes
no estrangeiro e recorda que “o direito de cidadania é um dos fundamentais
estabelecidos” na Lei Fundamental. Na sua óptica, esta matéria deveria ser
incluída num eventual processo de revisão.
O político
reconhece, no entanto, que perante a dimensão da bancada da maioria “é difícil”
à oposição ver as respectivas ideias aprovadas: “Esta Constituição não nos dá
espaço de manobra para revermos alguns aspectos, porque precisávamos de 2/3 do
número de deputados”.
Ndonda
Nzinga não deixa de observar um handicap na actuação da oposição: “Falta o
princípio da complementaridade e concertação. Há muito orgulho e cada um quer
protagonismo político”.
Consagrar
a prisão perpétua em Angola
Ao
comentar para o SOL o 5.º aniversário da Constituição, o secretário nacional
para a Economia e Finanças do PRS, Sapalo António, mostra-se crítico, a exemplo
de outros responsáveis da oposição, do actual modelo de eleição do PR.
Defende,
por isso, candidaturas individuais à Presidência da República, através de
eleições directas e voto universal.
É
igualmente defensor da eleição dos magistrados judiciais e do Ministério
Público, tal como dos juízes dos tribunais. Indica ainda que, em caso de
revisão constitucional, o futuro texto devia estabelecer um aumento da pena
máxima de prisão dos actuais 24 anos “para 50 ou mesmo prisão perpétua”, uma
vez que não consagra a pena de morte.
CASA-CE
alerta para dependência do PR
Não
fugindo ao posicionamento deixado pelos políticos da oposição que falaram ao
SOL sobre este tema, o vice-presidente da CASA-CE Alexandre Sebastião considera
também “excessivos os poderes” do Presidente da República, ao ponto de “todos
os órgãos de soberania” dependerem do chefe do Estado.
“Formalmente
temos muitos direitos fundamentais na Constituição mas, materialmente, o
cidadão que ousar usufruir desses direitos é oprimido ou reprimido”, observa
Alexandre Sebastião.
Para o
responsável da coligação eleitoral, por a oposição, no seu conjunto, não ter
força suficiente para aprovar uma revisão da Constituição, isso deve levar a
que exista sensibilidade da parte do MPLA para avançar para um processo de
revisão.
Por outro
lado, defende que se “clarifique a implementação das autarquias” e conforme a
eleição do PR “às constituições liberais”.
No
entanto, o responsável da CASA-CE prevê muitas dificuldades para atingir estas
vontades: “Não será fácil admitir um processo de revisão porque continuam a
vingar quer os propósitos políticos, quer as pessoas que geraram esta
Constituição”.
MPLA acena
com 'voto do povo'
O MPLA é o
único partido parlamentar fazer um balanço “muito positivo” dos cinco anos em
que vigora a Constituição da República de Angola.
“A
oposição vê tudo de forma negativa. Os colegas que estão no Parlamento são os
mesmos que fizeram campanha contra a Constituição, que dizem que as eleições
foram fraudulentas, mas vivem da imunidade e dizem que não há liberdade. A
vigência da Constituição tem sido muito positiva”, atira João Pinto,
vice-presidente do grupo parlamentar da maioria.
Para
o dirigente, “se o povo angolano reprovasse a Constituição, teria dado nota
negativa ao MPLA, retirando-lhe 2/3 nas eleições de 2012, permitindo assim
alterações à Constituição”.
E,
prossegue: ao contrário daqueles que dizem que Angola “tem um regime
ditatorial”, nesses sistemas “não se elegem deputados”.
Questionado
acerca de alegadas diferenças de tratamento dadas pelos media públicos às
actividades das diversas forças políticas, João Pinto defende que quem tem
maioria “deve ser beneficiado”.
“É assim
em todas as democracias. Por exemplo, uma actividade do primeiro-ministro
português não tem mais publicidade, cobertura, do ponto de vista do impacto
mediático, do que as realizações de um responsável do PS?”, interroga.
Já sobre a
proibição imposta à realização de manifestações que se têm tentado organizar em
Angola afirma, convicto: “Não há manifestações para derrubar o Governo. Isso é
proibido pela própria Constituição. Devem promover-se manifestações positivas,
nomeadamente de combate ao analfabetismo e à pobreza”.
Procedimentos
para a revisão
A
iniciativa de revisão da Constituição compete ao Presidente da República ou a
1/3 dos deputados em efectividade de funções, segundo o artigo 233 da Lei
Fundamental. Já sobre a aprovação e promulgação, as alterações têm de ser
aprovadas por uma maioria de 2/3 dos deputados em efectividade de funções,
estabelece o artigo 234. As alterações aprovadas têm de ser reunidas numa única
lei.
O PR, por
seu lado, não pode recusar a promulgação da lei de revisão constitucional, sem
prejuízo de poder requerer a fiscalização preventiva pelo Tribunal
Constitucional.
O artigo 235
determina que a Assembleia Nacional pode rever a Constituição, decorridos cinco
anos da sua entrada em vigor ou da última revisão ordinária. Estabelece ainda
que o Parlamento possui, a todo o tempo, poderes de revisão extraordinária, por
deliberação de uma maioria de 2/3 dos deputados em efectividade de funções.
Sonhos
adiados
Com a
aprovação da actual Constituição, vários cidadãos viram cada vez mais longe o
sonho de se candidatarem à Presidência da República de forma independente, uma
vez que a própria Lei Fundamental estabelece que essas candidaturas são
“propostas pelos partidos políticos ou coligações de partidos, embora os
candidatos possam não estar filiados nos partidos políticos e coligações
concorrentes”.
Nesta
perspectiva, diversas figuras mediáticas da política angolana viram os seus
sonhos adiados, nomeadamente Luizete Araújo, hoje membro da CASA-CE, Vicente
Pinto de Andrade (ver pág 4), militante do MPLA, docente universitário e decano
da Faculdade de Economia da Universidade Lusíada de Angola. Quem chegou também
a preparar a candidatura foi o actual presidente da CASA-CE, na altura ainda
militante da UNITA.
A
Constituição recebeu os votos favoráveis do MPLA, PRS e Nova Democracia. A
UNITA votou contra e a FNLA absteve-se.
Sol
ANGOLA24horas
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