sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Albert Camus. A palavra de ordem de "libertação nacional" é sempre uma manobra da burguesia mundial para romper nossa luta


Esta cólera não se concretiza verdadeiramente em torno de reivindicações particulares. O fastio é geral e se desenvolve sobre os aspectos "econômicos", "políticos" e "sociais" da sobrevivência que lhes é imposta. A ausência de reivindicações precisas, concretas ou de proposições positivas torna mais árdua a tarefa de liquidação que os reformistas de toda laia sempre procuram efetuar.

http://www.algosobre.com.br/historia/administracao-colonial.html

Só a contraposição à tudo o que vem do poder em geral é explícita. A negação do existente constitui indubitavelmente a força elementar do movimento. Desde o início dos distúrbios, e apesar de todas as tentativas burguesas de chamar para a calma e enquadrar o movimento em polarizações ideológicas, conciliações, reformas e negociações, os proletários se afirmam terminantemente no terreno da luta de sua classe, assumindo diversas necessidades e interesses, e combatendo por impô-los no desenrolar da luta.

Em uma semana de enfrentamentos, a luta se estende por toda Cabila. O número de objetivos não deixa de se ampliar. As expropriações da propriedade burguesa se multiplicam. os proletários tomam as mercadorias que necessitam e destroem voluntariamente tudo que para eles sempre simbolizou repressão e miséria (incêndio do Escritório Central de Impostos, da prefeitura, assim como das sedes dos partidos pela identidade nacional...). Em alguns dias, a ebulição toma todas as cidades de Cabila.

No sábado, 28 de abril, "uma maré humana invade as ruas de Bugia, apesar de os confrontos mais sangrentos ocorrerem em cidades novas e em pequenos povoados... Uma vez mais, os edifícios públicos foram saqueados. Em Bugia, os manifestantes destruíram a casa de cultura, a Repartição da Fazenda, a estação de ônibus". (7) A jornada do sábado, 28 de abril, é a mais sangrenta, com uma trintena de vítimas, momento a partir do qual a relação de forças tendeu globalmente a inverter-se a favor do proletariado. Um jornalista anota que "entre 40 e 60 membros das forças de segurança foram mortos na quinta-feira, 26 de abril, numa escaramuça ao sul de Tébessa". (8) Destaque-se que vimos esta informação uma única vez... Este dado revelaria um armamento mais conseqüente do proletariado

A burguesia desconcertada
A angústia e a surpresa que suscitou na burguesia local o rápido desenvolvimento do movimento foram tão grandes, que ela oscila em sua ação e até se mostra relativamente paralisada. Tendo tentado diferentes tipos de réplica sem êxito, mostra não ser capaz de se dotar de uma linha clara e precisa de resposta.

As estruturas de enquadramento e mediação social foram completamente ultrapassadas. Mais ainda, nas lutas, estas estruturas foram denunciadas cada vez mais explicitamente, como testemunham os ataques aos tradicionais partidos independentistas. Esses fatos demonstram claramente que nenhuma formação política deste tipo consegue canalizar os transbordamentos e, além do mais e sobretudo, que a luta dos proletários em Cabila não é nem nacionalista, nem independentista, como toda luta realmente proletária. A palavra de ordem de "libertação nacional" é sempre uma manobra da burguesia mundial para romper nossa luta, para isolá-la e isolar o proletariado em cada país, e fazer possível assim sua derrota, país por país, frente à "sua" burguesia nacional. (9) Se bem que, na atualidade, esta ideologia foi superada pelo movimento da Argélia, o contexto mundial, marcado por uma grande debilidade internacionalista, faz com que esta luta não seja reconhecida, vivida, compartilhada e assumida como tal, pelo proletariado em outros países. Na França, em particular, a não-luta global do proletariado levou a ver o movimento proletário da Argélia só através de imagens que a burguesia cria, o que provoca uma reação de indiferença, de rechaço ou de defesa de pútridas bandeiras social-democratas. Graças a isso, o estado francês pôde continuar apoiando e enquadrando para as forças da ordem na Argélia impunemente.

Sobre o terreno, não obstante, a capacidade de repressão e controle militar da situação se viu reduzida pela amplitude que tomou o movimento. Os distúrbios não cessam de explodir em outras regiões, separadas por muitos quilômetros de distância, o que dificulta a ação das forças da ordem que não podem estar materialmente presentes em todas as frentes de luta. Os proletários aproveitam a topografia acidentada da região para travar por todos os meios o deslocamento das tropas repressivas, bloqueando as estradas de acesso. Ademais, as autoridades das cidades onde ainda se mantém a paz social temem que a extensão do movimento ganhe essas cidades, e por isso têm grandes reticências a responder favoravelmente aos chamados de reforço lançados pelas zonas onde a luta é forte.

Imagem: http://recollectionbooks.com/bleed/Encyclopedia/Camus/

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